ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | A construção do espaço urbano pelo cinema brasileiro contemporâneo |
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Autor | Aline Bittencourt Portugal |
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Resumo Expandido | Nos últimos anos, o cinema brasileiro independente tem produzido uma grande quantidade de filmes que tematizam o espaço urbano. São trabalhos que olham para as cidades filmadas com uma vontade de perceber modos de vida, formas de habitar e de se relacionar com o espaço urbano.
Essas produções acontecem em paralelo a grandes transformações dos centros urbanos, principalmente aqueles que serão sede da Copa de 2014. As cidades passam por uma reorganização espacial e simbólica na qual várias disputas emergem à superfície do tecido urbano. Novas partilhas do território são elaboradas diante desse reordenamento urbano, e com elas, novos processos subjetivos. Emergem a todo momento formas de pensar a cidade que querem nos fazer percebê-la como algo vivo, em constante disputa e construção, conectada com as demandas dos sujeitos que a habitam mais do que com um modelo de cidade pré-determinado, ou “padrão Fifa”. Que veem a cidade como espaço de construção de subjetividades, de relação, de construção do comum. Interessa-nos aqui perceber de que forma os filmes do cinema brasileiro contemporâneo podem ser configurar como modos de materializar esse desejo do encontro. Ou seja, se o espaço urbano tornou-se um espaço privilegiado de disputa de forças, em que afetos, corpos e formas de vida buscam se afirmar e constituir território, como as imagens produzidas sobre esse espaço podem ser também um campo de disputa a partir dos quais possamos pensar que projetos de cidade e, principalmente, do comum, estão em jogo? Enfocaremos essas narrativas audiovisuais para pensar de que maneira hoje elas podem se configurar como forma de pensar e de agir na cidade. Ou seja, perceber em que medida os processos de subjetivação se reconfiguram a partir da experiência estética, através da narrativa, da escritura do filme, das abordagens e dos fluxos de imagens e sons. Como afirma Cezar Migliorin, “inventar a cidade por relação é uma pragmática de cineastas que percebem no território formas de vida que precisam ser experimentalmente aproximadas, entre elas e com o próprio cinema.” (MIGLIORIN, 2011. p. 169) Vamos nos debruçar principalmente o filme Esse amor que nos consome, de Allan Ribeiro. Ele acompanha o grupo de dança Rubens Barbot, composta exclusivamente por bailarinos negros, se mudando para a nova sede – um antigo casarão na Lapa. Eles vivem sob a constante ameaça de serem expulsos dali a qualquer momento, pois a casa está à venda. Enquanto ensaiam para erguer o próximo espetáculo, grupos de possíveis compradores visitam frequentemente a casa acompanhados do corretor, e planejam o que será feito naquele espaço após a compra. Ao final do filme, terminam a costura de um grande tecido feito de retalhos, que será usado no espetáculo, e o estendem na fachada da casa, cobrindo a placa VENDE-SE ali exposta. O filme traceja sua relação com a cidade a partir de diversas camadas. Através da jornada da Companhia, o filme mostra o impacto da especulação imobiliária no cotidiano dos moradores da cidade, nesse caso uma companhia marginal que persiste apesar das adversidades, como a dificuldade de manter uma sede e espaço para ensaios. Durante o filme, acompanhamos as andanças noturnas e de fins de semana dos coordenadores da companhia (que moram na casa) pelas ruas do Centro, ocupando um espaço normalmente destinado à circulação em horário comercial, e considerado perigoso em outros momentos. Nessas caminhadas eles encontram e conversam com moradores do local, de outras casas e da própria rua. O filme propõe, ainda, números de dança pelas ruas cidade. Uma apropriação da cidade através da invenção, do movimento livre dos corpos que dançam. Sendo assim, analisaremos o filme percebendo em que medida ele propõe formas de(r)existências que tensionam o projeto oficial de cidade que está em curso no Rio de Janeiro nos últimos anos, e de que maneira o filme se relaciona com as esferas do desejo e do comum. |
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Bibliografia | CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994.
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