ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | O desenho animado: uma forma de arte moderna? |
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Autor | Annateresa Fabris |
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Resumo Expandido | Os filmes de animação norte-americanos conquistam de imediato os surrealistas, que detectam neles uma série de princípios congeniais à própria plataforma estética: senso do burlesco, gosto pelo non-sense, uso do irracional para atingir o real, mergulho no inconsciente, sujeição do olho a uma “ginástica” até então desconhecida, captação da realidade em movimento, destilação de uma vida absolutamente imaginária, justaposição ilógica de gags. Tendo em vista esses pressupostos, não surpreende que André Breton inicie um texto sobre a pintura surrealista – datado provavelmente de 1937 e centrado na questão da “contração da duração” como forma de atingir o desconhecido – com considerações sobre o desenho animado, apresentado como uma modalidade oposta à vislumbrada para a manifestação pictórica, mas não menos válida.
Se a atitude de Breton se justifica plenamente em virtude das questões mobilizadas pelo surrealismo, o interesse de críticos alinhados com a defesa de um léxico realista, como Mário de Andrade e Margherita Sarfatti, não deixa de provocar um senso de surpresa. A defesa do desenho animado por parte da crítica italiana insere-se na diatribe já centenária contra a fotografia como forma de reprodução esmerada do “cotidiano, evidente e vulgar”. Fauvismo, cubismo, dadaísmo, metafísica, abstração, surrealismo foram, no século XX, uma resposta ao predomínio de uma percepção fotográfica, à qual foi contraposta a dimensão da imaginação, da fantasia e da geometria. Se o futurismo tentou vencer a máquina em seu próprio território, imitando a “ilusão do cinematógrafo”, o futuro da pintura está na capacidade de ir além da fotografia. O cinematógrafo faz parte desse quadro de referências e, dentro dele, Sarfatti destaca a figura de Walt Disney, cujos desenhos animados conseguem, com êxito, a “fusão da imaginação irrealista com um mínimo de evidência realista” (SARFATTI, 1947, p. 30, 196-197). A máquina a serviço da inteligência e a fotografia a serviço da pintura, que estão na base do desenho animado, fazem vislumbrar neste a “primeira pedra da ponte, que, mais cedo ou mais tarde, deverá ser construída sobre a fenda que separa o público da pintura. É possível que se forme assim uma nova linguagem plástica, acessível à multidão, que voltará a despertar seu interesse pela plástica e a aproximará desta, acostumando-a, aos poucos, a ler e entender o alfabeto das novas formas”. Se o desenho animado se encontra num estágio ainda elementar, isso não impede que a crítica anteveja seu desenvolvimento futuro, depositando nele a esperança de que se demonstre capaz de expressar “a deformação gráfica e conceitual em compreensível idioma figurativo” (SARFATTI, 1947, p. 198-199). |
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Bibliografia | ANDRADE, Mário de. "Fantasia" de Walt Disney. In: "O baile das quatro artes". São Paulo: Martins, 1963, p. 67-83; BLUMENFELD, Samuel. Dalí-Disney: rencontre surréaliste à Hollywood. "Le Monde hors-série". Paris, nov. 2012-jan. 2013, p. 26-28; BRETON, André. La peinture animée. In: "Oeuvres completes". Paris: Gallimard, 1992, v. 2, p. 1253-1259; SARFATTI, Margarita. "Espejo de la pintura actual". Buenos Aires: Argos, 1947. |