ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Trajetória na encruzilhada: auto-imagem do artista no país de todos |
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Autor | Raul Lemos Arthuso |
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Resumo Expandido | Na virada da primeira para a segunda década do século XXI, ganhou destaque dentro do cinema brasileiro uma produção independente que trazia novos elementos ao panorama contemporâneo. Essa produção, longe de ser um movimento estilístico ou de ter preocupações únicas, mais próxima aos modelos artisticamente reconhecidos dos grandes festivais internacionais, é formada por filmes realizados, muitas vezes, à margem do sistema de financiamento via editais e subvertendo os modelos industriais de produção de grande equipes hierarquizadas, cristalizados no período 1995-2005.
Apressadamente denominado "novíssimo cinema brasileiro", filmes como Estrada para Ythaca, Amigos de Risco, A Fuga da Mulher Gorila, A Falta que Me Faz, Riscado e Os Residentes são regidos pela lógica dos coletivos, “importada”, por sua vez, das artes plásticas, onde um conjunto de artistas trabalham juntos produzindo, ao mesmo tempo, sua obra e a de seus colegas, numa conjunção de interesses artísticos e afetivos que relega a segundo plano as questões econômicas imediatas. Essa lógica de produção, aliada a seus baixíssimos orçamentos, mereceu atenção de Cezar Migliorin, que dera o nome de "cinema pós-industrial" ao conjunto da produção independente que despontava nos grandes festivais brasileiros na virada da década. Por outro lado, é possível identificar algumas caraterísticas de estilo comuns a vários filmes: a precariedade como propulsor estético; a relação forte com o digital como uma alternativa para um cinema grande e pesado; o elogio do grupo e da amizade; a política dos afetos; e, especialmente, o cinema em primeira pessoa. Se a história o cinema brasileiro moderno é marcada por uma dialética entre a voz do cineasta/intelectual e a voz do outro, a produção contemporânea independente inverte radicalmente essa lógica: os filmes vão formular questões subjetivas, particulares, refletindo anseios e preocupações dos autores ligadas, essencialmente, ao lugar do artista na sociedade, no mundo e o significado de sua existência. Muitos dos filmes trazem uma construção que os cineastas fazem de si mesmos no interior das narrativas, sejam elas ficcionais ou documentais, refletindo sobre seu lugar social, sua identidade histórica e o contexto do entorno do qual faz parte. A tarefa deste trabalho consiste em propor um olhar crítico para a trilogia formada pelos filmes Estrada para Ythaca, Os Monstros e No Lugar Errado, do coletivo formado pelos diretores Ricardo e Luiz Pretti, Guto Parente e Pedro Diógenes, e tomá-la como um caso exemplar das estratégias estéticas do cinema brasileiro independente contemporâneo. Os três filmes são construídos a partir de tensões significativas da situação do artista e das mudanças na sociedade brasileira na primeira década dos anos 2000. Estrada para Ythaca é um filme da superação de um luto simbólico, em que se sublima uma situação indesejada ao se alcançar uma espécie de "terra prometida" a partir de laços afetivos e da auto-suficiência do grupo; Os Monstros se faz das tensões entre o artista e a sociedade que o cerca, dentro de um quadro de transformação urbana, no qual só resta ao artista cercar-se dos parceiros para continuar suas realizações; e No Lugar Errado traz em seu interior uma tensão entre o espaço da encenação e o espaço do público, o espaço da criação e o da recepção, o quadro e o fora, tendo a inquietação como tônica. São três filmes que formulam, no interior da narrativa ficcional, pequenos elogios sobre seu modo de produção e a visão de mundo dos cineastas. O presente trabalho visa realizar uma análise, a partir desses três filmes, da "autoimagem ficcional" construída pelos realizadores como uma chave para abrir questionamentos sobre a situação do cinema brasileiro independente e da vida do artista no quadro das transformações sociais ocorridas no país ao longo da última década. |
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Bibliografia | ANDRADE, Fábio. Armadilhas de uma época. In: Revista Cinética, Setembro de 2010.
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