ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Crítica de cinema e crítica social: a recepção de Dançando no Escuro |
|
Autor | Marina Soler Jorge |
|
Resumo Expandido | A partir de uma releitura do conceito de distinção de Pierre Bourdieu, nossa proposta geral de pesquisa é investigar de que maneira determinadas obras são valorizadas pela crítica de cinema e como o discurso canônico sobre arte, expresso por críticos internacionais e nacionais de relevância, passa a aceitar categorias típicas da cultura de massas, como o entretenimento e o uso de narrativas padronizadas.
No caso do trabalho em questão, analisaremos a recepção do filme Dançando no Escuro, de Lars Von Trier (2000), obra de grande repercussão entre o público de cinema "de arte" e entre a crítica e que recebeu o prêmio de melhor direção em Cannes. O que nos interessa analisar na recepção do filme mencionado é o impacto de sua crítica política à sociedade moderna e em especial à sociedade norte-americana, acusada na obra de criar mecanismos de integração e repressão enganosos e injustos, sobretudo através da própria cultura de massas (filmes musicais) e de um sistema penal preconceituoso e suscetível a erros grosseiros. Tendo em vista que Lars Von Trier não é um diretor de mensagens delicadas e humanistas, e que suas obras apresentam uma visão pessimista sobre a civilização, cabe analisar de que maneira a crítica cinematográfica reagiu a sua não-dissimulada crítica social. Da mesmo forma, pretendemos investigar quais são os critérios utilizados pelos críticos ao analisar uma obra de cunho eminentemente político, ou seja, em que medida o discurso internalista, para falar com Bourdieu, sobrevive ao conteúdo externalista de uma obra política, cuja repercussão da mensagem narrativa talvez ultrapasse em grande medida a repercussão da intenção estética. Em obras como A Distinção e O Amor Pela Arte, Pierre Bourdieu chama a atenção para o fato do gosto e o discurso do iniciado em arte, tidos como legítimos, diferem do gosto e do discurso "comum" pelo fato de apoiarem-se numa análise internalista da obra, que opera com elementos como a forma, o estilo, a estética e sua inserção na história do campo artístico em questão. O discurso e o gosto daquele que "não entende" de arte, e que a aprecia pelo prazer, emoção, e instrução que esta possa lhe dar, está limitado ao que Panoksky chamou de "propriedade sensíveis", e que revelam um espectador mais preocupado com as sensações e a instrução que a arte causa do que com sua contribuição para a história do meio. Assim, em Bourdieu, mantêm-se a tradição de vislumbrar o discurso do iniciado como fator da distância entre espectador e obra, elemento de uma relação tida como ideal por Adorno e Horkheimer e problematizada por Walter Benjamin como inadequada para a compressão da cultura de massas. Aquilo que no texto clássico de Adorno e Horkheimer sobre a Indústria Cultural é visto como modelo de interação entre o homem e a arte - a distância crítica - em Bourdieu é analisado como elemento de distinção social, pois apenas pode manter uma distância crítica o espectador que está equipado com o repertório considerado legítimo dentro do campo da história da arte. Ao espectador não iniciado resta a aproximação pelo prazer, tida como alienante por Adorno e Horkheimer e ilegítima por Bourdieu (no sentido de não reconhecida como adequada no interior campo artístico específico e como elemento de instauração de diferenças sociais simbólicas). No entanto, no caso de um filme político como Dançando no Escuro, essa questão talvez tenha de ser problematizada. Ainda que se trate de um filme que pretende contribuir para a evolução estética do meio específico - pois questiona, entre outros, a "beleza" da imagem da indústria cultural (musicais) e a montagem limpa do cinema clássico -, é possível que sua repercussão, inclusive no discurso crítico profissional, esteja mais relacionada ao conteúdo político e a seu apelo à emoção do espectador - que sairá do filme lacrimoso, quando não debulhado em lágrimas, e revoltado pelo quanto de injustiça social ainda há no mundo - do que a sua contribuição estética. |
|
Bibliografia | BOURDIEU, Pierre. A Distinção. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2008.
|