ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | “Como em cena de um filme foi quase real”: canções no documentário brasileiro |
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Autor | Ramayana Lira de Sousa |
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Resumo Expandido | A produção documental brasileira a respeito da música popular é profícua e reforça a relação íntima entre canções e cinema. No entanto, esta proposta pretende discutir o papel das canções populares em documentários que não tematizam diretamente a música, ampliando a possibilidade de entender a relação música/documentário como produção de novos sujeitos e políticas. Interessa-nos investigar como as canções que aparecem em documentários brasileiros recentes (sejam elas cantadas por personagens, reproduzidas no momento da filmagem ou adicionadas na pós-produção) cumprem uma tarefa ambígua. É certo que, por um lado, em diversos momentos dos filmes, as canções pontuam de forma melodramática e sensacionalista uma alteridade que parece se formar no miserabilismo e na marginalização. Contudo, e será esta a ênfase deste trabalho, há canções que iluminam as alteridades de forma mais sutil, principalmente por criarem fricções entre personagem e realizador, ficção e documentário, imagem e som.
Algumas das canções iluminadoras a que nos referimos aparecem em filmes como A falta que me faz (Marília Rocha, 2009), O céu sobre os ombros (Sérgio Borges, 2011), Pacific (Marcelo Pedroso, 2011) e, de forma mais radical, em As canções (Eduardo Coutinho, 2012). Tais canções fazem parte de um repertório popular e, longe de aprisionar as personagens em um mundo de reprodução de séries industrializadas, ou de construi-las como sinédoques de grupos marginalizados e iletrados, permitem emergir subjetividades insuspeitadas, ajudando a criar figuras e políticas novas inscritas nos procedimentos específicos de cada filme. Partimos do princípio de que o encontro dos estudos de cinema com os de música popular é campo ainda em formação mas que se mostra promissor. Um primeiro passo nesse aproximação é o questionamento do termo "música popular", muitas vezes diferenciada da emblemática MPB, categoria que tradicionalmente evoca grandes "autores" nacionais como Chico Buarque e Caetano Veloso. A "música popular" a que nos referimos nessa proposta tem o escopo ampliado para incluir o que convenciona chamar de "brega" e outras formar de canção de apelo popular, em um movimento que procura evitar uma hierarquização das formas. O que nos interessa saber é o que é produzido quando o sentido amplo da música "popular" entra no documentário. Reconhecendo o importante lastro de pesquisas que pensaram, de maneira histórica, a relação música poupar e cinema brasileiros (TINHORÃO, MORETTIN, COSTA, VIEIRA), queremos contribuir com uma reflexão sobre o cinema contemporâneo, problematizando o papel das canções em documentários. Metodologicamente, seguimos as pistas deixadas por Sheila Whiteley quando afirma que "it is necessary to identify the interrelationships between musical sounds, lyrical texts and visual narratives [...] and how they produce and foreground different sensibilities"(xiv). É a rica interação entre elementos que nos interessa. Acreditamos que a música popular é bem menos "standard" do que descrito pela posição adorniana ao empregar dispositivos organizacionais de repetição e variação, ruptura e restituição. Assim, muitas vezes recusa uma lógica linear de preparação para um clímax e resolução final. Assim, a canção popular, tanto diegética quanto extra-diegética, oferece a possibilidade de pensarmos o documentário brasileiro do século XXI como campo de tensão entre sujeitos, imagens e sons. Seja nas performances das canções pelos personagens do filme, seja na inclusão de trilha na pós-produção, o que temos é a possibilidade de ver música e filme empenhados na construção de mundos. |
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Bibliografia | COSTA, Fernando Morais da. Início do cinema sonoro – a relação com a música popular no Brasil como em outros países. In: MACHADO Jr, Rubens; SOARES, Rosana de Lima; ARAÚJO, Luciana Corrêa de. Estudos de cinema e audiovisual Socine. São Paulo: SOCINE, 2006.
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