ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Revolução e imagens de arquivo em "O fundo do ar é vermelho" |
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Autor | Julia Gonçalves Declié Fagioli |
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Resumo Expandido | O trabalho proposto tem como objetivo analisar o filme “O fundo do ar é vermelho” (Le fond de l’air est rouge, Chris Marker, França, versão original de 1977 e remontado em 1993), de modo a perceber possíveis relações entre cinema e revolução. O filme é construído com imagens de arquivo dos anos 1960 e 1970, e tem como tema central a ascensão dos movimentos socialistas e o seu declínio. Analisaremos a versão de 1993 que, com duração de três horas, é dividida em dois blocos: “Mãos frágeis” e “Mãos cortadas”. O primeiro bloco trata do surgimento e fortalecimento do socialismo; já o segundo, trata do seu declínio. Nos acontecimentos abordados no filme, não vemos uma revolução de fato acontecer, mas percebemos nas imagens um desejo, uma esperança revolucionária.
O cinema de arquivos é um cinema de montagem. Daí a escolha de se trabalhar com um filme de Chris Marker: o diretor tem como característica a utilização de arquivos; e a particularidade do seu cinema está na montagem e na forma como articula texto e imagem. Em “O fundo do ar é vermelho”, através de fragmentos, arquivos, entrevistas e comentários de cinegrafistas, o diretor retoma os movimentos sociais e cria uma perspectiva analítica dos acontecimentos, colocando-os em relação. Marker realiza um trabalho de construção da memória através das imagens. Ao montar um filme como esse, Chris Marker deixa um certo entendimento da política como marca da história no presente através de uma análise imagética de um contexto social e político. De acordo com Anita Leandro (2010), através da montagem de arquivos, Marker reforça o compromisso do cinema político com a história. Essas imagens revelam o engajamento daqueles que filmam, de modo que dão a ver as escolhas éticas dessas pessoas, e é na montagem que o diretor reafirma a força política desses arquivos. Para Giorgio Agamben (1995), há uma ligação estreita entre cinema e história. Ao analisar as teses de Walter Benjamin, o autor afirma que a experiência histórica se faz pelas imagens, que estão carregadas de história. Essa força política, portanto, ganha uma potência ainda maior em um cinema produzido a partir de imagens de arquivo, pois elas são um vestígio material que nos permite rememorá-lo, como caracterizou Leandro. Para investigar as relações entre cinema e revolução, é preciso delinear o que se entende por revolução. Ao analisar as teses sobre o conceito de história, escritos de Benjamin amplamente conhecidos, Michael Löwy (2005) relaciona a revolução à ideia de redenção. A revolução, para Benjamin, diz respeito a uma transformação ampla na história, à interrupção de um processo que levaria à catástrofe. O arquivo, mesmo que seja apenas uma pequena parte do acontecimento, significa algo apesar de tudo e suscita uma leitura. Reutilizar um arquivo do passado é encontrar as condições necessárias para reinscrevê-lo no curso da história. Ao caracterizar as imagens de arquivo, Didi-Huberman (2008) se detém, sobretudo, em sua quase impossibilidade de dar a ver algo. No momento da filmagem, o real ainda é ilegível, em devir. Filmar em meio a uma revolução, em situações de perigo, pode significar a produção de uma imagem sem a compreensão da mesma: só a montagem e o olhar sobre as imagens associadas permitem um entendimento mais amplo. Para Sylvie Lindeperg (2010), o cinema de arquivos é constituído por dois momentos distintos e essenciais: tomada e retomada. Ela considera a montagem dos arquivos como uma “retomada”, mas chama atenção para a importância da “tomada”, a saber, o olhar de quem a produziu. Teríamos então, uma dupla operação do arquivo: uma primeira legibilidade, que está na gênese do arquivo. É o momento da captura, em que se define um enquadramento, um campo e um fora de campo. A segunda legibilidade, portanto, é dada na montagem. Nesse sentido, Marker faz um trabalho minucioso de montagem e é preciso nos comentários, de modo a produzir uma reflexão sobre o acontecimento filmado. |
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Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. O cinema de Guy Debord. 1995. Disponível em: http://www.intermidias.blogspot.com.br/2007/07/o-cinema-de-guy-debord-de-giorgio.html. Acesso em 07 de setembro de 2013.
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