ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Hiroshima, mon amour: contorções de um cinema lírico |
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Autor | Amanda Ramalho de Freitas Brito |
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Resumo Expandido | Buscaremos analisar a representação do lírico em Hiroshima, mon amour (1959), de Alain Resnais. Para Octavio Paz (1956), a poesia lírica recria sua própria experiência, que pode ser entendida como a experiência subjetiva do eu-lírico que recria o mundo através de uma linguagem em primeira pessoa ou a experiência da própria linguagem (a linguagem que se autorreflete por meio dos artifícios postos no texto). Hegel (1993, p. 607), compreende a linguagem lírica como aquela que representa a interioridade subjetiva, penetra a realidade pela consciência individual, e busca por meio da densidade alegórica da linguagem “exprimir não a realidade das coisas, mas o modo por que elas afetam a alma subjetiva e enriquecem a experiência pessoal”. Tal perspectiva teórica é pertinente à nossa discussão, em decorrência do enredo de Resnais se desenvolver em torno do ponto de vista da personagem central (interpretada pela atriz Emmanuelle Riva) que filtra a tragédia de Hiroshima pelo viés da própria tragédia pessoal. Pensaremos o ponto de vista narrativo como um elemento unificador do lírico na diegese audiovisual. Para refletir o ponto de vista narrativo, utilizaremos as bases teóricas de Genette (1989), Martin (2003), Vanoye; Goliot-Léte ( 1994), Gaudreault; Jost (2009). Procuraremos investigar como a linguagem lírica fomenta a criação poética em Hiroshima, mon amour a partir da experiência criada pelas imagens dos corpos dos personagens unificadas ao espaço e ao tempo diegético. O corpo representa em Hiroshima, mon amour o espaço que reverbera a unificação do cotidiano com o universal, da memória com o esquecimento, do eu com o outro e do amor com a morte. Ideias sugeridas pela primeira imagem do filme: enquadramento em primeiro plano do entrelaçamento erótico dos personagens que sugere pelo brilho dos corpos, o suor do amor e o calor da bomba atômica, imagem reforçada pela poeira nos corpos. Aliás, é por meio do encontro amoroso que se desenvolve uma percepção lírica em torno dos motivos da ausência e da trajetória fatídica da personagem que se confunde com a trajetória fatídica do outro (as vítimas da bomba atômica), entrelaçando memória coletiva e memória individual. As contorções do corpo serão investigadas como espaço de sugestões da linguagem figurativa e subjetiva que constitui o lírico na diegese cinematográfica. O “corpo” será estudado pelo viés teórico de Deleuze (2005, p. 227), que concebe as atitudes gestuais do corpo como categorias da vida (o corpo não pensa, mas reflete a embriaguez, os esforços e a resistência). Pretendemos analisar como o corpo adquire significação a partir de sua relação com os aparatos cinematográficos: planos, enquadramentos, travellings e voz em off. E ainda como os movimentos gestuais são harmonizados aos diálogos. Os diálogos poéticos do filme reclamam sua própria condição de arte, nos instigando a averiguar como o lirismo se instaura na diegese por meio da autorreflexão. De acordo com Manevy (2006, p. 227) a autorreflexão se expressa na Nouvelle Vague através do diálogo com a história do cinema, da intenção do autor em explicitar as artificialidades da linguagem cinematográfica, como a mise-en-scène. Em Hiroshima, mon amour, por exemplo, o diálogo com a tradição cinematográfica se expressa através do espaço onde os amantes se encontram, nomeado Casablanca. Quase no desfecho do filme a câmera enquadra o nome do café, sugerindo sentidos em trânsito, que se concretizam a partir do diálogo com o filme Casablanca (1942), de Michael Curtiz. Diante disso, procuraremos refletir como o lírico se expressa na organização da linguagem audiovisual ao admitir a sua condição de representação. Para isso trabalharemos com o conceito de autorreflexão proposto por Stam (2008), definindo o fenômeno como toda narrativa que “chama atenção para sua própria artificialidade como construtos textuais”, que no caso do cinema põe em relevo a consciência da própria linguagem cinematográfica. |
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Bibliografia | DELEUZE, Gilles. A imagem-tempo. Eloisa de Araujo Ribeiro (tradução). São Paulo: Brasiliense, 2005.
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