ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | O FUTURO MAIS QUE IMPERFEITO: O RETROFUTURISMO NA FICÇÃO CIENTÍFICA |
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Autor | Gelson Santana |
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Resumo Expandido | Este trabalho parte de uma suspeita, o imaginário da ficção científica, enquanto gênero cinematográfico, ultrapassou a figura simbólica do tempo. Isso nos leva a considerar que a ficção científica, como gênero, é coisa do passado. Podemos dizer então que a ideia de futuro tradicionalmente desenvolvida pertence ao passado hoje. Mesmo em narrativas que abordam o passado pelo futuro, esse futuro do passado apresenta-se esmaecido. Na medida em que hoje tanto o passado quanto o futuro encontram-se paralisados pelo estranho e extenso presente. E o presente modela-se tal qual um espaço sem forma que abriga tanto o passado quanto o futuro. A experiência mesma de futuro hoje não é mais que uma tangente que nos prende a um presente que se estende, mesmo que sem um rumo determinado. O espaço do futuro, que o anjo de Walter Benjamin ainda podia vislumbrar, foi corroído irremediavelmente pelo presente paralisado. Se podemos dizer que o presente mostra-se na estrutura de um abismo sem direção, é porque as noções básicas que o norteiam já não têm mais os suportes do espaço a frente e do porvir que o sustentavam. Por isso, filmes como Ela, uma história de amor (“Her”, 2013), de Spike Jonze, espelham-se na prática desse abismo. No filme de Spike Jonze o futuro não se apresenta, ele figura, à maneira de uma intemporalidade presente. Desse modo, o futuro travestido de presente mostra-se marcado pela substância do passado. Nele nada mais pode ser construído, somente o que podemos fazer é nos certificar de que na vida ainda habitamos, mesmo que passivamente, uma narrativa que teve um início e caminha hipoteticamente para um fim. Vivemos sem a perspectiva do conhecimento que nos habilitaria a nos conformarmos à narrativa da história de acordo com a experiência existencial na perspectiva do futuro. O que podemos dizer é que o imaginário da ficção científica ultrapassou a figura simbólica que norteava a imagem que o presente refletia do futuro se fazendo, portanto, representação de um hipotético porvir. Este era o traço imediato que dava sentido ao gênero. Esse traço desdobrou-se na imagem cinematográfica tradicional como uma espécie de imaginário fundador. Agora encontra-se para além da imagem fundadora, ou seja, na imagem mesma experienciada na figuração do imaginário. Se não existe mais espaço na representação para um porvir que espelhe no simbólico a diferença entre o presente e o futuro, é porque esta contraiu-se no passado. Dessa maneira, todo futuro retrocede ao passado, para apresentar-se segundo algo declaradamente sem o vir-a-ser. Podemos dizer que o futuro enquanto forma simbólica precisa da experiência da espera no presente. Mas se o presente se estende em várias direções ele prescinde da espera que o categoriza no movimento que dá ordem ao futuro e, portanto, o coloca na dimensão do tempo neutro. No presente sem o espaço da espera nada mais está por vir. No presente acelerado não há mais distinção entre passado e futuro, eles se transformaram em figuras acessórias do agora. O passado e o futuro reduzidos à potência zero do presente emergem ativos na velocidade do “acontecendo”. O que ainda determina a presença do futuro são as inscrições do passado representadas, mesmo que melancolicamente, na representação de um futuro já vivido. Neste sentido, podemos dividir o percurso histórico da ficção científica em três fases: a primeira, o presente do futuro, compreende os filmes clássicos, nela o homem é o centro motor da narrativa, exemplo: O dia em que a terra parou (1951), de Robert Wise; a segunda fase, o futuro do presente, trata a tecnologia e a ciência de forma mítica, exemplo: 2001, uma odisseia no espaço (1968), de Stanley Kubrick; e a terceira fase, neutra, abandona ou faz desaparecer a prática simbólica de futuro ao voltar-se para os traços que o passado pode amarrar no presente a ponto de ser capaz de neutralizar a ideia mesma de futuro, exemplo: A outra Terra (2011), de Mike Cahill, em que o presente é a única alternativa do futuro. |
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Bibliografia | BENJAMIN, Walter. “As armas do futuro”. In: O capitalismo como religião. São Paulo: Boitempo, 2013, pp. 69-72.
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