ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Surnam Viet Given Name Nam - modos de narrar a história e a nação |
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Autor | Gustavo Soranz |
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Resumo Expandido | Em Surname Viet Given Name Nam, seu terceiro filme, a cineasta Trinh T. Minh-ha, vietnamita radicada nos E.U.A., reflete sobre a condição da mulher no Vietnã. Para isso, evita informações factuais sobre o país, optando por construir um filme baseado na tradição oral e na memória popular, utilizando músicas, provérbios e ditos populares que expõem a condição feminina na cultura vietnamita. Imagens de arquivo do Vietnã, narrações em voz over e letreiros com trechos de citações literárias apresentam fragmentos da memória de um país. Nesse cenário, o filme valoriza depoimentos de mulheres vietnamitas por meio de entrevistas para a câmera. Ao invés de uma historiografia tradicional sobre a cultura vietnamita, somos apresentados a histórias particulares de mulheres que viveram a história recente do país. Com o desenrolar do filme, diferentes estratégias, como a opção pelo depoimento das mulheres em inglês, o cuidado na iluminação e na cenografia e o uso de letreiros, vão evidenciando o caráter ambíguo das entrevistas, até que o ensaio e a preparação do depoimento vem à tona, quebrando a transparência do discurso fílmico e revelando que foram encenadas para o filme. Os depoimentos dados pelas mulheres são, na verdade, interpretações de depoimentos de mulheres vietnamitas do pós-guerra.
Podemos dizer que o uso da entrevista como meio de acesso mais direto ao “real” é criticado pela diretora, que enfatiza o grau de controle e de interferência que a edição de uma entrevista impõe. Tal opção contribui para a crítica em relação ao estatuto do documentário, enfatizando o aspecto ficcionalizante da representação. Segundo a diretora (TRINH, 1992, p.165) “ter o encenado e o real juntos é chamar atenção para a política das entrevistas, e para evidenciar as manipulações que tendem a ser tomadas como naturais no documentário”. Em um segundo momento novas entrevistas, algumas com as mesmas mulheres da primeira parte, são apresentadas de forma completamente diferente. O controle evidente da luz e do som nos primeiros depoimentos dá lugar a conversas mais espontâneas em locações mais naturais e despojadas, com movimento e vida ao redor. Sabemos agora que essas mulheres vietnamitas estão nos Estados Unidos e não no Vietnã. Os depoimentos agora são sobre suas próprias vidas. A condição de imigrantes vem a tona em situações que apresentam a inserção dessas mulheres na cultura norte-americana. Desse modo, o filme passa a discutir questões ligadas a identidade e nação, elaboradas por meio das narrativas individuais de mulheres em condição diaspórica. Alguns dos depoimentos desta segunda parte do filme são emitidos em vietnamita e legendados em inglês. Desse modo, a reflexão sobre a tradução intercultural acrescenta mais uma camada de densidade ao filme. Para Lan Duong, (2009, p.196) “Trinh problematiza a ideia de traduções e subtítulos como `discursos visualizados` e recusa a ideia de que a tradução garante acesso ao Outro feminino”. Quando observado em relação à filmografia anterior da cineasta, Surname Viet Given Name Nam aprofunda uma série de questões caras ao projeto político e estético de Trinh T. Minh-ha, que já haviam sido elaborados anteriormente nos outros filmes. Aqui neste caso, a crítica às formas de representação cultural, sobretudo em relação ao documentário, continuam, acrescidas da reflexão crítica sobre a ideia de tradução intercultural. A ênfase especial na questão do feminismo mais especificamente é outro elemento a ser destacado. Sem insistir de modo recorrente em estratégias utilizadas nos filmes anteriores – podemos pensar na montagem em Reassemblage e na voz over em Naked Spaces - a cineasta traz novidades e nos entrega um filme que provoca o cinema documentário em suas convenções mais tradicionais, explorando e expondo os limites da entrevista como recurso central do filme, de modo a expandir as possibilidades criativas desta seara fílmica. |
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Bibliografia | DUONG, Lan. Traitors and translators: reframing Trinh T. Minh-ha’s Surname Viet Given Name Nam. In: Discourse, Vol.31 n.3. Michigan: Wayne State University Press, 2009. Pp. 195-2319.
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