ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | A memória, o corpo e as estratégias do documentário. |
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Autor | Sylvia Beatriz Bezerra Furtado |
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Resumo Expandido | Em “Branco Sai, Preto Fica” (2014), filme de Adirley Queirós, a ficção científica é o lugar para o qual a história é jogada, seu ponto de fuga. É preciso falsear a vida dos seus três personagens, todos absolutamente tragados pela violência do Estado, da Polícia e da Miséria, três instituições avassaladoras, dado que o cinema talvez não suporte a magnitude inscrita nos corpos de cada um deles. É preciso inventar o tráfico através de passaportes para que a periferia de Brasília tenha acesso à cidade, que ao final é mesmo a expressão e o alvo mortal daqueles a quem é negado o direito de passagem. Brasília é o lado de dentro da história. Para além da fronteira estão os restos, justo aquilo que vai retornar, em forma de desenho de animação, com armas e máquinas de destruição, como único modo de fazer a vingança. Para destruir a realidade (dura, insuportável) é preciso imaginar um futuro, um lugar onde estão todos sob a mesma condição. Mas onde ninguém sai ileso ou vitorioso.
Branco sai, preto fica, palavra de ordem que dá início ao massacre da juventude negra da periferia, que é o título do filme, diz da mais dura expressão de uma memória, inscrita nos corpos amputados de Marquim e Shokito, quando da tragédia/extermínio dos frequentadores do “Quarentão”, um clube blackmusic, importante nos anos 80, lugar da festa dos moradores da Ceilândia e que foi invadido pela polícia. Dilmar Durães, que faz o Dildu em “A Cidade é uma Só?,” agora interpreta um homem que veio do futuro colher provas contra o Estado. É nesse futuro que podemos ver o lugar da ficção científica como um núcleo acolhedor do desafio de fazer um documentário extremamente colado nesse mundo e cheio de artifícios e corpos dilacerados. O candidato Dildu não joga mais seus dados num jingle popular que poderia fazer dele um político, deputado federal, para representar a Ceilândia. Ele não é mais candidato a nada desde que foi atropelado pela enorme carreata que lhe atravessou o caminho quando seu resto de carro parou de funcionar por falta de gasolina. Agora é a geração 80, apartada pela miséria cuja cor da pele é uma denúncia, que vem explodir o Poder Absoluto, com suas avenidas largas e seus prédios impeditivos. Afinal, em “Branco Sai, Preto Fica”, Adirley Queiróz mostra mais uma vez que sabe fazer cinema com os subterrâneos, lugares onde estão sendo planejados o retorno e a volta do reprimido. O elemento mais forte da construção da ficção científica nessa cinema do agora são menos seus espaços escuros, interiores sinuosos e túneis de entrada para os seus interiores que as engenhocas construídas para fazer o mundo continuar, ter movimento. O elevador que dá acesso à casa/escritório de Dj Marquim é talvez a forma mais contundente de conhecer os arranjos e estratégicas desse cinema resistir. Nossa proposição é tomar esse embate entre a memória e a forma cinema em “Branco Sai, Preto Fica”, tendo duas questões como centrais: a discussão sobre as estratégias documentais e as da ficção científica engendradas num mesmo cinema e o lugar dos corpos como inscrição e arquivo. Para tal, traçamos um certo percurso na obra de Michel Foucault, naquilo que se pode encontrar de uma teoria do corpo. Em especial, quando Foucault toma o corpo como matéria da memória e como superfície de modulações por técnicas disciplinares e de biopolítica. |
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