ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Tabu, de Miguel Gomes: saudade colonial |
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Autor | Michelle Cunha Sales |
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Resumo Expandido | Nesta comunicação pretendemos aproximar o pensamento do sociológo brasileiro Gilberto Freyre do filme Tabu, do realizador português Miguel Gomes. Apesar de, nomeadamente, em diversas entrevistas Miguel Gomes defender o caráter ficcional de sua obra e o desinteresse em relação a história de Portugal, e de discussões que pudessem aproximar o filme de uma abordagem sociológica da cultura recuperaremos, através da tese de Gilberto Freyre em relação a excepcionalidade da experiência colonial lusa um ponto de convergência com muitos aspectos do filme Tabu, sobretudo na maneira com a qual o português que vive em Africa é representado. Esse tipo “particular” de ocupação/colonização portuguesa teria tido como consequência a criação de um mundo ultramarino regido mais por afeto e empatia do que pelas obrigações coloniais ou da língua Segundo Freyre, conformando uma sociedade “luso-tropical”. Como contraponto a essa ideia, no ensaio intitulado “Para acabar de ver com a lusofonia”, o curador e pesquisador de arte António Pinto Ribeiro comenta o legado teórico de Freyre acerca de um entendimento sobre a lusofonia, chamando atenção a dois aspectos: o primeiro é um registro histórico que nos lembra a forma com que a lusofonia é lançada por Portugal ainda no século XIX sugerindo um direito histórico de ocupação, requerendo as terras que iam de Angola a Moçambique, apresentadas num Mapa Cor de Rosa que foi duramente rechaçado pelo governo britânico. O segundo aspecto é a maneira com a qual essa ideia da lusofonia é apropriada pelo governo de Salazar a fim de negociar a permanência portuguesa na Africa lusófona, enquanto as potências européias discutiam os termos da independência e descolonização de suas antigas colônias. A maneira com a qual a vida na colónia é representada, abundante de paixões e o cotidiano harmonioso entre colonos e africanos, relaciona-se diretamente com as teses defendidas amplamente por Gilberto Freyre sobretudo a partir de O Luso e o Trópico. Neste ensaio, o sociológo constrói sólidas argumentações que sustentam um tipo particular de colonização portuguesa, mais cristocêntrica do que eurocêntrica, e por isso, potencialmente agregadora e harmoniosa, capaz de construer um mundo particular cuja metrópole não era o ponto de partida para a exploração colonial mas para a promoção de potencialidades mestiças e de uma harmoniosa sociedade colonial nos trópicos. Miguel Gomes toca em questões que aqui se relacionam com Gilberto Freyre, através de uma Africa idílica tão ligada a um certo tipo de representação do “outro”. Como questiona Nuno Domingos: “Os africanos da plantação de chá do Gurué que trabalhavam no Monte Tabu, retratados em actividades laborais e em outras situações quotidianas, parecem integrados, na sua impessoalidade, embora a História tenha vindo a salientar que nas plantações de chá da Alta Zambézia o trabalho forçado e todas as práticas de semi-escravatura abundavam. O filme, partindo da ideia de que o império está a prazo, não oferece nenhuma leitura que permita perceber por que razão afinal está a prazo. Porque há uma guerra, sim, mas por que razão há uma guerra?” Com a resposta a essa pergunta pretendemos analisar o filme Tabu, de Miguel Gomes relacionando-o livremente com obras e textos da cultura portuguesa contemporânea que nos remete ao mesmo tipo de representação do sistema e da sociedade coloniais.
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Bibliografia | ARENAS, Fernando. Lusophone Africa. Beyond Independence. Minessota Press, 2011.
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