ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Lugar de memória e identidade social no documentário de Haile Gerima |
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Autor | Carlos Francisco Pérez Reyna |
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Resumo Expandido | O combate, que não foi o primeiro enfrentamento armado entre a Etiópia e Itália, aconteceu em Adwa (Etiópia) em 1896. Os italianos vieram da parte oriental da região, e mais precisamente da colônia da Eritreia, e foram rapidamente derrubados pelos exércitos comandados por diversos líderes da região da atual Etiópia. Esta inusitada vitória passou a ser considerada pelos africanos em geral e sua diáspora, como uma vitória militar total de uma nação africana sobre o colonizador europeu, alimentando a ideologia pan-africanista e a defesa pela autonomia do continente africano.
O documentário A Batalha de Adwa (1999) de Haile Gerima revela o seu ponto de vista sobre a questão. Isto é, o tema da resistência etíope ao invasor e colonizador italiano (e europeu). Nesse objetivo o cineasta escolhe tanto narrativas oficiais quanto narrativas do universo acadêmico, variando com fontes orais para interpretar este fato e apresentar as memórias coletivas construídas desde então (HALBWACHS; 1990). Diversas imagens pictóricas ilustram o discurso (as primeiras datam do ano da batalha e se multiplicam ao mesmo tempo em que o próprio acontecimento vem sendo reinterpretado), demonstrando assim o interesse dos artistas em retratar o fato que se tornou mundialmente conhecido. No decorrer do documentário, o cineasta percorre várias aldeias e vilarejos que se encontram entre a capital Addis Abeba (Etiópia) e o próprio campo da batalha que visualizamos principalmente através de suas montanhas. Gerima recolhe memórias, iniciando com um mito, associando-o com visitas de diversas igrejas nas quais o casal imperial (Imperador Menelik I) passou, costurando, o passado com textos orais e alguns escritos, complementando o imaginário sobre a batalha com rostos diversos apresentados, na tela, a evocação de uma dimensão religiosa que impregna a atmosfera da batalha. Em entrevista, Haile Gerima afirmaria: “senti que devia fazer da maneira que estava sendo lembrado. Da canção ao canto, a lembrança: fazer as montanhas e as estradas falar. Tinha necessidade em parar onde podia encontrar pessoas mais velhas”. Vale lembrar que o documentário foi realizado na altura das comemorações ligadas aos 100 anos da Batalha. Assim passamos da rememoração ao longo do documentário para, no final, chegar à comemoração, então apresentada como uma vitória africana com uso e apropriação da história que permite reafirmar a capacidade dos etíopes - e dos africanos em nome do pan-africanismo reivindicado por Haile Gerima – seu domínio sobre seu passado e sua capacidade em utilizar este passado para consolidar sua identidade atual (POLLAK; 1992). Em suma, o diretor nos propõe perceber os mecanismos complexos utilizados para reconstruir o passado da batalha e nos quais as formas comemorativas ocidentais estão sendo incorporadas às comemorações (relevância do museu, selos, símbolos da vitória e construção de monumentos, bandeira). Uma das motivações é procurar saber, segundo o documentário, como as histórias de vida (memória individual e coletiva) constroem identidade social. Igualmente nos chama a atenção os deslocamentos do cineasta para revisitar os lugares de memória (NORA; 1984). Ao abordar temas ligados à história, o documentário revela áudio-visualmente o ponto de vista do cineasta sobre um determinado tema. Para Bill Nichols (2005), o filme documentário ao tentar reconstruir a realidade vai enunciar um discurso sobre o mundo histórico. Dessa maneira, contribui à construção e formação da realidade social, com maior propriedade que o cinema de ficção. Porém, de que maneira o cinema documentário se aproxima da reconstrução da Batalha de Adwa? São inquietações iniciais que esta comunicação procurará saber. |
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Bibliografia | HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vertice, 1990.
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