ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | O documentário "Jorge Amado" como marco na carreira de João Salles |
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Autor | Caroline Maria Manabe |
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Resumo Expandido | A carreira do documentarista João Moreira Salles pode ser considerada uma das mais interessantes no cenário nacional. Com uma produção para o cinema bastante conhecida, seus três filmes (Nelson Freire, Entreatos e Santiago) se destacam, principalmente, pelo apuro formal empreendido, usando técnicas do documentário moderno, especialmente o recuo nos dois primeiros; e inaugurando o filme ensaio no Brasil com Santiago.
Tendo esses filmes do diretor como referência, é interessante olharmos para o início da carreira de João Salles e observar como sua relação com diferentes procedimentos do documentário se alterou. Suas primeiras produções, as séries China, o império do centro (1986) e América (1989), ambas exibidas pela extinta Tv Manchete, possuem como fio condutor a voz over, é ela que guia o filme inteiro e encadeia em torno de si os outros elementos visuais e a trilha sonora. Esta voz se aproxima do espectador através do tom amigável que se projeta, por se colocar com os olhos brasileiros, marcando a posição de onde está falando, e por ser uma voz conhecida, a do ator José Wilker. Na época destas produções, João Salles desconhece a tradição do documentário. Para ele o formato documentário era dado: voz over, uma ideia fechada e imagens para transmitir essa ideia. Assim, se alinha à ética educativa do documentário, em que há predomínio de uma vontade didática, de querer explicar tudo, uma obrigação de falar do mundo. Este estilo de documentário será, mais tarde, denominado de documentário-cabo (Ramos, 2008) ou ainda de neo-clássico. Isto porque, a ética do saber do documentário clássico é predominante, mas utiliza de procedimentos inventados pelo documentário moderno, como a entrevista e o depoimento. O documentário-cabo assere com voz over e com voz com corpo. O último título produzido dentro desta estilística é Jorge Amado de 1992. Nele, o escritor baiano revela a influência de Gilberto Freyre em seu pensamento, ressaltando a influência que Casa grande e senzala (1933) teve para esclarecer a identidade brasileira, em que o principal pensamento é de que o mestiço possui as virtudes de todas as raças e não os defeitos. Esse é o ponto central do documentário, e que irá guiar a construção do discurso do filme. Uma das sequências mais bonitas do filme é feita justamente para ilustrar a questão da miscigenação no Brasil. Cada entrevistado, desde figuras conhecidas até anônimos baianos, respondem sobre quem são seus antepassados. Todos os entrevistados estão diante de um fundo vermelho, um pequeno cenário com um pano, colocado nas locações das entrevistas, não enquadrando a paisagem além dos limites do pano. Podemos dizer que este filme representa uma transição na carreira de João Salles, pois já estão presentes alguns elementos que irão marcar sua carreira no futuro, como a busca por um personagem, novas formas de expressar visualmente ideias, e não explicitá-las somente através da voz over e ilustrá-las com alguma imagem. Mas a característica mais marcante para ainda não ser considerado documentário moderno é o caráter didático presente, mesmo com todos os tensionamentos proporcionados pelas estratégias do diretor. A mudança de procedimento de filmagem e concepção do filme na carreira de João Moreira Salles vêm acompanhada também de uma mudança de interesse do que filmar, pelo tema do filme. O diretor afirma que considera que sua carreira tem o formato de um caracol, no sentido de que começou tratando de temas muito longe de sua realidade, e aos poucos foi se aproximando do Brasil, de sua cidade até chegar a propostas mais pessoais. |
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Bibliografia | BERNARDET, Jean-Claude. Cineastas e imagens do povo. São Paulo: Brasiliense, 2003.
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