ISBN: 978-85-63552-15-0
Título | Imagens de uma cidade em crise: Recife no cinema contemporâneo |
|
Autor | Fellipe Luís de Melo Fernandes |
|
Resumo Expandido | No segundo momento da retomada do cinema brasileiro, a paisagem urbana tem funcionado como fio condutor estético e narrativo na elaboração de obras cinematográficas produzidas em Pernambuco. São curtas e longas-metragens que constroem suas narrativas a partir da representação da paisagem e, assim, elaboram imagens da cidade. As obras estão em consonância com as discussões políticas entre os gestores públicos e a sociedade civil organizada, que coloca em xeque o modelo de desenvolvimento urbano em vigor no estado. Diante do crescimento econômico experimentado nos últimos anos, Recife tem passado por um processo de transformação do espaço urbano: cada vez mais a cidade é planejada para quem possui automóvel, a especulação imobiliária tem empurrado as classes mais baixas para zonas cada vez mais distantes e a preocupação com a segurança tem levado a população a viver dentro de muros altos, sem frequentar espaços públicos.
Reflexo de um processo de modernização urbana recente e recorrente em países onde verifica-se o desenvolvimento do capitalismo tardio, essa crise urbana é vista como um fenômeno global por pensadores como David Harvey e Mike Davis. O primeiro acredita que o aprofundamento negativo das desigualdades sociais ocorrido nos últimos anos em diversas metrópoles semeia uma tensão civil (HARVEY, 2013). Vale lembrar também que a crise urbana faz parte de uma cadeia de acontecimentos, e, como a ponta Ermínia Maricato, está no centro de outras crises e é formada também por um conjunto de outras tensões (MARICATO, 2013). Nesse ponto, podemos associar à ideia de crise urbana a concepção de presente vazio elaborada por Leo Charney, que poderíamos resumir na seguinte simplificação: uma das grandes questões contemporâneas, a sensação de deriva, decorre da organização da vida em torno do passado e do futuro, que provoca um esvaziamento do presente (CHARNEY, 1998). O paradoxo poderia ser exemplificado na disputa de desejos de cidade desenhada pela própria paisagem do Recife: o progresso, em prédios altos que apontam um futuro de opulência econômica, disputa a nossa vista com o passado histórico dos prédios, casas e sobrados antigos. Nos filmes que constroem, a partir da linguagem audiovisual uma paisagem da cidade, com recorrência Recife é apresentada como um espaço hostil e, por vezes, opressor, quase sempre atuando como força contrária ao elemento humano. Essas obras nos fazem pensar em teóricos que dedicam à representação do espaço um papel central na constituição do fazer cinematográfico. Para Jacques Aumont, por exemplo, o cinema pode ser considerado uma arte do espaço, ainda que essa própria noção de representação seja problematizada, já que para ele o espaço não é um percepto, como o movimento ou a luz, e portanto não pode ser visto apenas, mas construído (AUMONT, 2004). Aprofundando essa linha de raciocínio, Giuliana Bruno descreve o cinema como uma arte espacial, como a própria arquitetura. Para ela, os filmes seriam uma espécie de meios de transportes que nos levariam a lugares interiores, através da estética, da narrativa e da construção de uma psicogeografia específica (2007). Como resultado, cada obra cinematográfica seria responsável pela construção de um mapa emocional. Partindo desses conceitos, pretendemos analisar como a ideia de crise está presente na imagem do Recife no cinema contemporâneo a partir de quatro longas-metragens: Amigos de risco (Daniel Bandeira, 2007), Avenida Brasília Formosa (Gabriel Mascaro, 2010), Febre do rato (Cláudio Assis, 2011) e O som ao redor (Kleber Mendonça Filho, 2012). Os filmes foram selecionados pelo protagonismo que dedicam ao espaço urbano e pela maneira como traduzem a crise da cidade em estéticas e narrativas distintas. Eles estão unidos pelo convite que fazem aos espectadores para conhecer um lugar onde geografia e emoção são traduzidas pela linguagem cinematográfica em obras que nos falam não apenas sobre o lugar em que vivemos, mas sobre nós mesmos. |
|
Bibliografia | AUMONT, Jacques. O Olho interminável. Sâo Paulo: Cosac Naify, 2004.
|