ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Picture Styles: gênero e raça na fotografia audiovisual contemporânea |
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Autor | Marina Cavalcanti Tedesco |
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Resumo Expandido | Através de nossos estudos temos constatado que gênero e raça foram fatores determinantes (ainda que não os únicos) na conformação das técnicas hegemônicas da fotografia audiovisual. Tal aspecto fica bastante evidente ao longo do manual de fotografia cinematográfica 50 anos luz, câmera e ação (2005). No referido livro Edgar Moura, importante diretor de fotografia brasileiro, explica: “Quando usar um contraluz difuso, porém, já que ele é normalmente duro e direto? Em dois casos: primeiro, quando ele for tocar no rosto da atriz... Quando esse contraluz, direto e duro, toca a face das atrizes, é uma catástrofe. Se essa luz tocar a bochecha da atriz, vinda assim, por trás e frisante, estará na sua pior direção e revelará volumes e relevos até então insuspeitados. Qualquer imperfeição na pele aparecerá como um caso para o dermatologista... Seu uso é mais necessário do que parece à primeira vista. Em muitos mais casos do que se pensa, é preciso sacrificar a força necessária ao contraluz em favor da beleza, indispensável à atriz” (MOURA, 2005, p.132-134).
Se a beleza é indispensável para a atriz, nem sempre o mesmo se aplica ao ator, como fica claro nos ensinamentos do fotógrafo estadunidense John Alton, redigidos na década de 1940: “As marcas no rosto de um homem são como as divisas de um soldado, são conquistadas. Elas significam caráter; portanto, nós não devemos tentar eliminá-las, uma vez que nos closes masculinos é exatamente isso que nós ambicionamos” (ALTON, 1997, p.113) É mister destacar, contudo, que a beleza a qual fazem referência as citações acima é racializada. As atrizes devem reluzir e não brilhar por duas razões: “primeiro, brilho conota suor, algo inapropriado para ladies, ou seja, mulheres realmente brancas, e também remete à sujeira corporal; segundo... a pele negra, em especial sob forte iluminação, e notavelmente em fotografia, com frequência tem altas-luzes brilhantes, daí a associação entre brilho e pessoas não-brancas (DYER, 1999, p. 78). É tendo em vista as reflexões recém apresentadas que nos propomos a realizar uma análise crítica dos chamados Picture Styles. Picture Style é um recurso disponível em algumas câmeras HDSLR Canon que permite ao usuário definir uma série de parâmetros os quais interferirão diretamente no modo como as imagens, sejam elas fixas ou em movimento, serão captadas e armazenadas. Desde que foi introduzido no mercado se tornou uma verdadeira febre entre fotógrafos e cinegrafistas, que os desenvolvem, compram, vendem e disponibilizam a fim de personalizarem seus trabalhos. Modelos extremamente populares, como a 5D Mark II, a 7D, a T2i, a 60D, entre outros, oferecem tanto a possibilidade da instalação de novos Picture Styles como seis pré-definidos. A fim de elucidar as diferenças entre eles, o fabricante produziu uma série de tutoriais em vídeo, que podem ser vistos no YouTube. Foi precisamente após assistir a um deles, intitulado Undertanding Canon’s Picture Style (part 1I), que surgiu a necessidade de refletir sobre este recurso fotográfico e audiovisual tão popular. Em pouco mais de 6 minutos, são exibidas imagens de mulheres loiras e morenas, todas elas brancas, construídas utilizando os seis Picture Styles já mencionados, enquanto a voz de um homem explica os efeitos provocados pela opção por um ou outro. Diante do exposto, pretendemos com este trabalho: 1) aprofundar os estudos sobre gênero e raça na fotografia audiovisual, saindo do campo das prescrições e adentrando no dos equipamentos; e 2) refletir sobre os impactos de um recurso desenvolvido a partir de lógicas sexistas e racistas na estética das produções contemporâneas, recordando o que afirmava Milton Santos: “Uma técnica é nominalmente plena, absoluta, mas raramente é usada em sua plenitude. Cada ator a toma segundo uma maneira. Teoricamente, ela é plena; na prática não o é... Passamos do ‘absoluto’ irrealizado ao ‘relativo’ realizado” (SANTOS, 2006, p. 124). |
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Bibliografia | ALTON, J. Painting with light. 2 ed. Berkeley e Los Angeles, CA/Londres: University of California Press, 1997.
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