ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Mora na filosofia:Oscarito encontra Stanley Cavell |
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Autor | Ney Costa Santos Filho |
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Resumo Expandido | I
Um dos pontos-chave do sucesso da chanchada carioca dos anos 50, além dos números musicais e do estilo de humor de seus principais atores, foi a adesão do público às circunstancias do cotidiano dos personagens dos filmes. Em Esse Milhão é Meu, dirigido por Carlos Manga em 1959, a partir de um acontecimento absurdo – o premio de um milhão de cruzeiros ao personagem de Oscarito, Felismino Tinoco, por não faltar ao trabalho na repartição pública, um dia sequer na semana – há uma transformação no casamento e na vida da personagem. De imediato percebe-se a alusão irônica a um fato da vida brasileira: o parasitismo dos funcionários enquistados na máquina pública. O fato de o Rio de Janeiro ser ainda capital,fazia com que esses tipos fossem muito presentes no dia a dia da cidade e de seus habitantes. Era alguém que havia arrumado,como se dizia à época,uma “colocação”. Giorgio Agamben ressalta a potencia reveladora da paródia quando promove uma leitura através da inversão. No caso de Esse Milhão é Meu, isso acontece pela via do cômico e do bizarro. O prêmio de um milhão de cruzeiros provoca uma reviravolta no cotidiano de Oscarito, revelando a ele e ao espectador as teias e as relações falsas que emaranhavam não só o seu casamento, mas também a conhecida mixórdia brasileira entre o público e o privado. II Stanley Cavell é um dos maiores filósofos americanos vivos. Formado na tradição da filosofia analítica, desenvolve uma original interpretação do Wittgenstein de “Investigações Filosóficas”, como um filósofo da cultura e faz uma leitura de Ralph Waldo Emerson que incorpora seu pensamento à filosofia. Em The World Viewed, o primeiro de seus livros sobre cinema, Cavell parte de sua experiência como espectador e daí busca uma nova relação filosófica entre nós, os filmes e os outros. Também publicou estudos sobre melodrama, Buster Keaton, Fred Astaire e Bergman, entre outros, observando nos modos operativos do cinema expressões de determinadas questões filosóficas. Em Pursuits of Happiness, Cavell analisa sete comédias americanas dos anos 30 e 40, chamadas por ele de comédias de recasamento, e assinala o valor da experiência do cotidiano e do ordinário na vivencia do casamento. Ela destaca também nesses filmes o protagonismo feminino; a percepção de que estar casado é cotidianamente a capacidade e a vontade do casal em recasar-se; que o cotidiano é que provoca ou impede o interesse em manter um relacionamento dia após dia. Embora os filmes tenham sido produzidos em um contexto histórico e cultural muito diverso do de hoje, Cavell se pergunta “o que é o casamento,para que o seu valor preserve essa importância e autoridade entre as relações humanas?” Ao relacionar essas questões com o último Wittgenstein e a utopia americana do transcendentalismo de Emerson, Cavell traz conceitos da filosofia da linguagem ordinária para o estudo do cinema. Para Cavell, o reconhecimento do valor das circunstancias do dia a dia, o aqui e agora, são uma espécie de possibilidade de recasamento com a vida. Na comédia da Atlântida a personagem de Oscarito, antes servil e conformada, transforma até a vigarista que o queria depenar, em um amor que o libera, ao final do filme, de um casamento opressivo e medíocre. III A proposta do trabalho é, a partir de algumas observações de Cavell, ver as “remarriage comedy” e algumas comédias da Atlântida, como reveladoras de um sentido buscado no além ou no aquém-vida, mas que, de fato, reside na aceitação dos limites da existência e do conhecimento humano, o que não elimina o ceticismo, mas não nos faz rir da vida, o que seria cinismo, mas sim, rir na vida, como faz a comédia. |
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Bibliografia | CAVELL, Stanley. Esta América nova, ainda inabordável. São Paulo:Editora 34,1997
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