ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | O uso repetido de quartetos de cordas de Beethoven em filmes de Godard |
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Autor | Luíza Beatriz Amorim Melo Alvim |
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Resumo Expandido | Esta comunicação é a continuação do estudo apresentado na Socine de 2014 sobre músicas do repertório clássico preexistente que se repetem em filmes de Jean-Luc Godard. Porém, aqui vamos nos restringir a trechos dos quartetos de Beethoven op. 59 n.3, op. 131, op.132 e op. 135, cada um deles presente em dois dos seguintes filmes: O novo mundo (1962), Uma mulher casada (1964), Duas ou três coisas que eu sei dela (1967), Carmen (1983) e Liberté et Patrie (2002).
Dentre todas as peças do repertório clássico preexistente nos filmes de Godard, esses quartetos de Beethoven são uma verdadeira obsessão para o diretor, estando presentes em diversas fases de sua carreira. Godard chegou a ser retratado pelo colega de redação dos Cahiers du Cinéma, Éric Rohmer, como um personagem colocando na vitrola os mesmos compassos do quarteto op.132 no filme O signo do leão (1959). Como no trabalho anterior, baseamo-nos nos conceitos de diferença e repetição, de Deleuze, e de eterno retorno, de Nietzsche. Ou seja, entendemos a repetição não como uma volta do Mesmo, mas sim como contendo a diferença, tal qual o retorno sempre travestido com outras máscaras de Dionísio na tragédia grega. Com efeito, é comum na obra de Godard que frases, réplicas de personagens e, no caso de nosso estudo, peças musicais sejam retomadas de um filme a outro. Fazemos, então, uma análise fílmica detalhada das sequências com essas peças musicais repetidas e buscamos significados mais ou menos estáveis, ou seja, repetidos com diferença: infidelidade, tragicidade, perguntas sem resposta. Assim, o início da sexta variação do quarto movimento do Quarteto n.14 op.131, foi utilizado por Godard no curta-metragem de 1962, O novo mundo (episódio do filme coletivo RoGoPaG), e em Uma mulher casada. Nos dois filmes, parte dos diversos trechos com essa música está em cenas de ciúme ou de briga entre casais porque os personagens masculinos duvidam da fidelidade de suas companheiras, o que gera, por vezes em ambos os filmes, uma demonstração de violência física. O tema da infidelidade reaparece na utilização do segundo movimento (Andante) do Quarteto n.9 op.59, n.3 em Uma mulher casada e em Carmen. Em Uma mulher casada, há a utilização dos mesmos trechos musicais desse quarteto em locais privilegiados: o início, o meio e o final do filme, em que a protagonista Charlotte está com o marido ou com o amante. Além disso, os planos semelhantes de fragmentos de corpos aumentam a sensação de repetição nesses momentos. Não importa com quem Charlotte esteja, se com o marido ou com o amante, há uma repetição na diferença. Por outro lado, a música transmite tragicidade e fatalidade pelo constante movimento do V grau para o I, ao passo em que nada na interpretação da protagonista confere essas características. O início do Andante está também no começo de Carmen e nos aponta o tema da infidelidade ao vermos a personagem Claire (que gosta de Joseph, o guarda com quem Carmen se envolve) ensaiando o quarteto com outros músicos. A fatalidade notada na música está presente também na história de Carmen. Em Carmen, outro trecho lento é ouvido na apresentação do quarteto durante o filme que supostamente seria rodado num salão de hotel pela protagonista e sua equipe. É o início do terceiro movimento do Quarteto n.16 op.135, que já ouvíramos em Duas ou três coisas que eu sei dela (1967), momento de reflexão em ambos os filmes. Também está, nesses dois filmes, o motivo inicial do primeiro movimento do Quarteto op. 135, que tem uma estrutura musical de pergunta e resposta. Tal como ela, a protagonista Juliette se faz vários questionamentos. Já em Carmen, Joseph começa a se dar conta de que Carmen não o ama mais e ouvimos a pergunta do motivo após a resposta. Finalmente, temos o Quarteto op. 132, presente em Carmen e em Liberté et Patrie (documentário sobre o pintor suíço Aimé Pache). Além da melancolia da música, há imagens em comum, como as do mar de Carmen e as do lago suíço do documentário, ao som de gaivotas. |
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Bibliografia | AUMONT, J. Lumière de la musique. Cahiers du cinéma, n.437, supplément nov. 1990.
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