ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | O olhar hegemônico do espectador e o olhar marginal de Júlio Bressane. |
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Autor | Ana Beatriz Buoso Marcelino |
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Resumo Expandido | Júlio Bressane (1946), cineasta carioca considerado um dos precursores do Cinema Marginal, imerge em seus primeiros filmes uma linguagem poética singular e inventiva que recusa à narrativa convencional, equacionando a experimentação como forma maior de expressão.
O período destacado, entretanto, adentra ao universo do Tropicalismo, movimento cultural ideológico engajado pelo sentimentalismo nacionalista, com o objetivo de questionar e elevar a produção cultural brasileira em anteparo às forças dominantes como um intuito de desconstrução e intervenção cultural que culmina no processo de metaforização do Brasil (Favaretto, 2007). Em meio a tal cenário explosivo cultural que caracterizou a época, o Cinema Marginal aparece como uma nova vertente do cinema brasileiro moderno, considerado uma nova fase do Cinema Novo, nitidamente inspirado no cinema underground americano por sua estética tosca e narrativa fragmentada aliando a invenção estética ao debate político, somando-se a outras tradições como o cinema de Mário Peixoto, Orson Welles, Godard e a Chanchada, junto à literatura de Lima Barreto e Machado de Assis, além do cancioneiro popular dos anos 30. Tal ousadia gerou um rompimento radical com o público, acostumado ao distanciamento do espetáculo, com o exclusivo objetivo de provocar e promover o ato reflexivo: um espectador que tenta juntar peças de um quebra-cabeça a princípio sem nexo. Dessa forma, o olhar do cineasta entra em conflito com o olhar domesticado do espectador, colocando-o sob uma postura decifradora em anteparo à hegemonia de um olhar constituído ao longo da história (Xavier, 2002). O impulso emergente de artista experimental de Júlio Bressane, entretanto, questiona a própria forma de fazer cinema, um suposto cinema de invenção (Ferreira, 2000), acentuado pelo ajuste formal e o tratamento dado às cenas que indica ao telespectador o avesso de soluções, prejudicando um entendimento linear das ações, direcionando caminhos de leitura e apreciação, um estilo marcado pela heterogeneidade e disjunção (Xavier, 2012), uma espécie de olhar corrosivo que percorre livremente os espaços e cria seu próprio interesse - características estas contempladas pelos filmes "Matou a família e foi ao cinema" (1969) e "O anjo nasceu" (1969), por exemplo. Assim, esta dialética de fragmentação intenciona a suspeita de uma possível crise formal, pois o olhar da câmera de Bressane é como uma máquina que tudo observa a seu próprio tempo, uma câmera que está longe de ser “tranquila”. Suas imagens trazem uma dimensão polêmica, intertextual, na recusa de envolvimento sob uma imobilidade que pode ser considerada dialógica. A liberdade da câmera de Bressane traz à tona uma diegese, enunciadora de um espaço off de reflexão independente das ações, com um olhar amplificador enriquecido pela disjunção. A parataxe, entretanto, aparece como elemento crucial para a diacronia das cenas. Sem encadeamentos ou subordinações, as séries são descontínuas e nem sempre olhar e objeto se encontram. Sendo assim, cada sequência é um recomeço através da liberdade do olhar a princípio sugerindo ser arbitrário, mas que no conjunto da obra produzirá sentido. Dessa forma, o fluxo de estímulo das ações é desencadeado fazendo com que o espectador tome uma suposta postura de decifrador da mensagem. Contudo, a condição do cineasta como um representante social imaginário torna ainda mais aguda esta discussão em vista dos desafios do cinema no atual mundo contemporâneo, assim, entender suas influências torna-se de suma importância que indubitavelmente são cruciais a compreensão de tal complexidade. |
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Bibliografia | FAVARETTO, Celso. Tropicália: alegoria e alegria. Cotia: Ateliê editorial, 2000.
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