ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | O cinema, a memória e as possibilidades de representação do Holocausto |
|
Autor | Fabio Luciano Francener Pinheiro |
|
Resumo Expandido | Um dos filmes mais polêmicos de toda a história do Cinema, Shoah (1985) do francês Claude Lanzmann, resulta de uma pesquisa de mais de uma década em que o cineasta entrevistou dezenas de sobreviventes do Holocausto. O cineasta leva as vítimas, em sua maioria judeus poloneses, para os locais onde na década de 1940 funcionavam campos de extermínio na Polônia. O filme é construído a partir deste doloroso encontro entre os judeus e os locais onde aconteceram as atrocidades cometidas pelos nazistas. São longos depoimentos em que as diversas vozes dão vida a narrativas de horror e sofrimento, permeadas por imagens de paisagens serenas, cobertas pelo mato e pelo esquecimento.
Diante do absurdo deste acontecimento, da industrialização do assassinato e da ausência de registros das mortes, o filme, de mais de dez horas, aposta no testemunho seco, direto e pessoal dos sobreviventes. O que se coloca de imediato diante destas considerações é a possibilidade de se representar um acontecimento tão marcante quanto o Shoah. Algo tão horrível e incompreensível deve ou pode ser representado? Se a resposta for afirmativa, qual seria o meio (oralidade, imagem) e a forma mais ética de abordar este acontecimento? Como recuperar a memória dos sobreviventes e transformar em discurso estas lembranças e ao mesmo tempo transmiti-las para as gerações seguintes? Como nomear aquilo para o qual não há palavras? A dificuldade se torna ainda maior para as vítimas (os judeus) quando tomamos conhecimento que os próprios algozes (os nazistas) tinham cuidados especiais com a linguagem ao se referir as suas práticas criminosas com termos vagos e genéricos como Solução Final, evacuação, viagem a leste, deportação, além do cuidado para não deixar rastros de suas ações. “Como podemos conter na estrutura de uma obra de arte uma representação de algo que, na sua própria essência, recusa ser contido?”, pergunta Alberto Manguel (2001, p.279). Thomas Elsaesser (1996, p. 147) posiciona o debate sobre as possibilidades de representação do Holocausto a partir da comparação entre filmes tão distintos que abordam o tema, como o Shoah de Lanzmann e A Lista de Schindler, de Spielberg. O confronto entre os dois filmes implica em diferenças estéticas, morais e até religiosas, que Elsaesser amplia para uma leitura da História do Cinema entre Hollywood e a Europa. O autor argumenta que a natureza paradoxal de um acontecimento como o Holocausto desafia qualquer forma de representação. Ele questiona se uma experiência tão única e extrema quanto Auschwitz teria sua singularidade traída por qualquer outro tratamento que não seja o testemunho dos sobreviventes, deixando que nomes e datas falem diretamente por si, para em seguida argumentar que a própria dificuldade em definir o horror do Holocausto e o seu lugar na História levam a obrigação de encontrar novos discursos sobre o evento. Esta comunicação procura estabelecer um diálogo com possibilidades de representação do Holocausto, detalhando as estratégias utilizadas tanto em Shoah, de Lanzmann, quanto em outras produções que abordam o tema: Nuit et Brouillard (1955), de Alain Resnais, celebrado cineasta da memória; A Painful Reminder: Memory of the Camps, o famoso documentário que teve envolvimento de Alfred Hitchcock e que reúne imagens obtidas pelas tropas britânicas no momento da libertação dos campos de Bergen e Belsen, em território alemão, em abril de 1945; Vozes da Lista, o documentário de 2004, produzido para comemorar os dez anos do filme A Lista de Schindler e para marcar as atividades da Shoah Foundation, entidade que pesquisa e registra as memórias de vítimas do Holocausto. São mobilizados estudiosos como Vicente Sanchéz-Biosca, Pierre Nora e Aleida Assmann, que abordam os filmes citados dentro das perspectivas da memória, história, passado e as possibilidades da representação. |
|
Bibliografia | ASSMANN, Aleida. Espaços da recordação : formas e transformações da memória cultural. Campinas: Ed. da Unicamp, 2011.
|