ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | As deambulações nos filmes da Belair: o rompimento do telos |
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Autor | Leonardo Guimarães Rabelo do Amaral |
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Resumo Expandido | O ano de 1970 marca a Belair, produtora criada por Julio Bressane, Rogério Sganzerla e Helena Ignez. Bressane havia realizado, em 1969, O anjo nasceue Matou a família e foi ao cinema, enquanto Sganzerla tinha dirigido o paradigmático O bandido da luz vermelha e A mulher de todos, logo na sequência. A junção de ambos resultou na criação da Belair e de uma estética bastante singular na história do cinema brasileiro. Esse cinema se caracterizava por modos econômicos de produção.
É possível perceber uma experimentação que transcorre em meio a uma ausência de uma teleologia que marca as ações dos personagens, que erram sem destino, causas e objetivos pelo mundo. As ações desses personagens são direcionadas pela experiência, segundo uma diegese muitas vezes gratuita e inexplicável. Sem destino, personagens, pessoas e a própria câmera vagam pelas ruas da cidade, em meio aos carros e ao caos urbano. Nada programático, pois o programa deste cinema é se coloca junto do outro, em uma investigação que necessita fundamentalmente da participação desse outro que está nas ruas, num quintal do forró, no morro carioca, nos cenários da cidade. Deambulações sem destino e de razões nem sempre conhecidas que têm no encontro com o outro o principal substrato desse cinema distópico. Esse rompimento teleológico representa uns dos principais traços de contraposição entre esses filmes e os do início do Cinema Novo. Deus e o diabo na terra do sol, símbolo desse cinema, marcava-se por um telos fortemente centrado na certeza de uma revolução figurada em seu sertão-mundo, na travessia como maneira de transpor a própria história e romper com uma condição anterior. As alegorias constituídas por Glauber Rocha buscam um sentido totalizante, em uma espécie de esperança na profecia de uma recapitulação histórica do Brasil do sertão, da seca e da pobreza. A crise da história se manifesta agora em uma completa desesperança de uma redenção diante de um horizonte sem transformações. O símbolo da derrota alcança sua representação em obras como Terra em transe, que se articulam a partir das transformações alegóricas cujos agentes históricos, ainda assim, se mostram portadores de uma esperança que os redima de sua condição. No entanto, ao se cotejar a América do Sul vista em Terra em transe com aquela recriada em Sem essa Aranha, vemos o quanto existe de diferença de postura em relação a cada uma delas. Eldorado é um entrelaçamento de culturas e efeitos que alcançam um sincretismo que dá a ver um equacionamento de tudo isso em favor de um discurso político que ainda assim se vincula a uma espécie de causalidade mágica. Enquanto isso, percebemos em Sem essa Aranha o que Ismail Xavier reconhece como “crise das totalizações históricas”. O Brasil está fora do mapa, não existem profecias a respeito de seu futuro, apenas a evidência de que está ausente do futuro. Resta então vagar sem destino, uma estória sem história, uma impossibilidade de totalizar os fragmentos. A ruptura da estrutura teleológica é a forma que esse cinema encontra para a representação de sua realidade. Passados os primeiros anos de ditadura e o cinema brasileiro buscava alcançar novas formas, bem como compreender a melhor maneira de se enfrentar o dado contundente da alteridade. Reconhecemos, então, uma cisão entre dois estilos diferentes que problematizaram o momento vivido. Como bem ressalta Ismail Xavier, enquanto um grupo ligado ao Cinema Novo buscava, em particular, um direcionamento ao mercado ou uma vinculação mais próxima a um cinema com ligação com os órgãos do Estado (e por isso adquire um status de establishement), outro grupo de jovens cineastas procuravam uma via mais radical. O grupo do Cinema Novo procurava falar dos problemas do país em um diálogo de mais aproximação política com o público, ao passo que “os marginais” assumiam uma defesa própria da experimentação da linguagem e da narrativa que dessem conta do tom agressivo que pretendiam para suas produções. |
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Bibliografia | BERNARDET, Jean-Claude. Nota sobre Bressane. Revista Cine-olho nº 5/6, junho/julho/agosto de 1979.
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