ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | O monge e o soldado / O escritor e o cineasta |
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Autor | Maria Augusta Vilalba Nunes |
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Resumo Expandido | O escritor e cineasta argentino Edgardo Cozarinsky declara em uma entrevista que sente-se um tanto esquizofrênico por trabalhar com cinema e literatura ao mesmo tempo, e se define como um monge enquanto escritor e um soldado enquanto cineasta. Ele faz essa analogia para evidenciar que duas faces muito distintas de sua personalidade se revelam conforme o meio de expressão com que trabalha. Ao colocar seu processo de criação na literatura e no cinema em lugares tão distantes Cozarinsky instiga a pensar sobre essa distância, e a questionar como a técnica e o processo de produção agiria sobre a criação e o gesto do artista.
Cozarinsky diz que fazer cinema é uma batalha em que ele deve sair de seu isolamento para procurar produtores, financiadores, enfim, alguém que viabilize a obra. Ele deixa claro que as complexidades da produção de um filme, são bem diferentes daquelas de escrever um livro. Desse modo, estaremos pensando, a partir de Cozarinsky, sobre como essas diferenças podem afetar o processo criativo do autor. Levantaremos para tal, algumas questões sobre a relação autor/obra, a partir de O que é um autor? de Michel Foucault, A morte do autor de Roland Barthes, O autor como gesto de Giorgio Agamben e do conceito de rastro em Derrida. Foucault e Barthes, cada um ao seu modo, refletem sobre a necessidade de se repensar a importância dada ao autor na obra. Barthes declara de maneira incisiva que autor deve morrer, para que nasça o leitor. Já Foucault afirma que não é possível pensar um conceito fechado de autor, pois este se manifesta de formas diferentes conforme a disciplina em que trabalha, o processo discursivo em que está inserido, a época e contexto cultural em que cria. Foucault propõe, então, que não se pense em um autor, mas em uma função-autor, isto é, que se pense a função que cada autor exerce em uma obra específica, conforme as relações que o permeiam. Tanto Foucault como Barthes buscam algo similar, isto é, desconstruir a primazia do autor com nome próprio, ou seja, o autor como referente primeiro para compreensão da obra. Nesse movimento temos a impressão que eles minimizam o papel do sujeito que cria, mas, como veremos eles não o anulam, o que eles fazem é afirmar a necessidade, eu diria política, de destituí-lo do lugar de poder que ele ocupa, isto é, não tê-lo como ponto da origem absoluta da criação, pois assim, abrir-se-ia espaço para uma leitura mais ampla e crítica da obra. Já Agamben faz uma releitura do texto de Foucault, problematizando a questão da ausência do sujeito, propondo que aquilo que fica da expressão do autor não é a marca de um sujeito, mas a marca de seu gesto. Contudo, segundo Agamben, seguindo aqui a mesma tendência de Foucault, o gesto também se apagaria na expressão mesma, deixando em seu lugar o vazio. Dito isso, pensamos que a ausência do autor poderia vir a ser o lugar onde se insere o rastro de seu gesto. Pensar em um rastro de gesto possibilita que desloquemos o autor, pois assim ele deixaria de ser um nome próprio, e se tornaria uma marca abstrata, indefinida. Derrida, que certamente não estava alheio a esta discussão sobre autoria, afirma que o ser aí do autor na obra só é possível, justamente, através do deslocamento de seus rastros. O rastro para Derrida nunca se refere a ele mesmo, mas sempre a outra coisa, a uma origem que nunca pode ser determinada. É por isso que pensar o autor como um rastro dentro da obra, é afirmar sua ausência, sem deixar de afirmar ao mesmo tempo sua presença. Tendo essas questões em vista, propomos pensar como Cozarinsky se coloca enquanto autor e como se dá a manifestação de seu rastro na literatura e no cinema, avaliando as aproximações e distanciamentos encontradas nesses processos de criação e de produção tão diferentes. |
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Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. O autor como gesto in Profanações. São Paulo: Boitempo, 2007.
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