ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Tempo que passa, tempo que permanece: a elipse em Mia Hansen-Love |
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Autor | Fabiano Grendene de Souza |
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Resumo Expandido | Como lembra Michel Chion (2007, p.290), elipses são omissões voluntárias de um fragmento da história, de um momento ou de um detalhe particular - omissões que o espectador pode ou não completar mentalmente. As elipses podem acelerar o ritmo da narrativa, surpreender o espectador, omitir um fato relevante que será revelado posteriormente. Por outro lado, as elipses também podem ser usadas parar criar um sentimento, uma certa atmosfera, muitas vezes através da união de momentos com elementos díspares. Por exemplo, a aproximação de instantes sucessivos em que personagens apresentam-se fisicamente diferentes ou a justaposição de sequências em que um protagonista tem sucesso e fracasso são algumas possibilidades de juntar cenas, promovendo a contaminação entre os dois momentos. Este tipo de elipse - que busca antes a revelação de sentimentos do que a surpresa narrativa - vem sendo exercitado por Mia Hansen-Love desde seu primeiro filme. Como salienta René Predal (2008, p.186), Tudo Perdoado (Tout est pardonné, 2007) apresenta uma elipse de doze anos para reconfigurar a relação entre um pai, viciado em drogas, e sua filha. No caso, com o salto no tempo, a filha passa da infância à adolescência, alterando a forma com que compreende seu progenitor. Já na comunicação apresentada aqui, estudam-se as elipses dos filmes mais recentes da realizadora francesa. Em Adeus, Primeiro Amor (Un amour de jeunesse, 2011) uma garota de quinze anos vive uma paixão adolescente e, quando o namorado parte para a América do Sul, ela permanece ligada a ele através das cartas que recebe. Mas elas cessam e, quatro anos depois, a protagonista, um pouco mais velha, passa a ter uma relação com seu professor de arquitetura. Então, nos interessa, em primeiro lugar, perceber qual o efeito causado pelo avanço no tempo: se a época romântica da juventude parece dar lugar ao universo adulto e uma certa acomodação, é também possível perceber - através de certas posturas de câmera - a ideia de que o tempo anterior continua presente, pelo menos na subjetividade da protagonista. Tal ideia, cimentada na contraposição das duas fases do filme, ganha evidência quando o namorado da adolescência reaparece no filme. Então, surgem novas perguntas: quais são os sentimentos da protagonista? Como as instâncias narrativas apresentam a protagonista junto aos outros personagens? Já Eden (2014) mostra vinte anos da trajetória de um DJ, narrando sua ascensão e estagnação profissional no universo da música eletrônica francesa. Em Eden, uma das estratégias que chamam a atenção é justamente a pouca alteração da composição física do personagem, embora a narrativa se passe em duas décadas. Se o tempo da história avança, mas o personagem não traz maiores alterações no corpo, surge uma série de questões: a dificuldade do abandono da juventude, o conflito do artista ao perceber que sua sensibilidade, de uma hora para outra, passa a não encontrar eco no mundo. Então, nos interessa justamente analisar a contraposição entre instantes em que o protagonista parece satisfeito profissionalmente, com a pista de dança ocupada por muitas pessoas, e uma sequência posterior, em que sua trajetória não parece tão ascendente. O foco nesses dois momentos de Eden é perceber como as imagens são organizadas para mostrar um olhar de similar apego ao protagonista, independente de como ele é tratado pelo mundo que o cerca. Tanto em Eden, como em Adeus, Primeiro Amor, as observações sobre a relação entre enquadramento, personagem e câmera são inspiradas na abordagem de Nick Browne (1982) sobre a forma com que certas posturas fílmicas causam empatia do espectador em relação a determinados personagens. Analisando as consequências das elipses e os elementos cinematográficos utilizados nas cenas implicadas neste procedimento,poderemos compreender alguns aspectos essenciais da obra de Mia Hansen-Love e, por conseguinte, do cinema contemporâneo.
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Bibliografia | BORDWELL, David. Narration in the Fiction Film. Madison: The University of Wisconsin Press, 1985.
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