ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Fabulações (alter)biográficas |
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Autor | César Geraldo Guimarães |
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Resumo Expandido | Este trabalho compara os procedimentos expressivos de dois filmes brasileiros recentes – Branco sai, preto fica (2014), de Adirley Queirós, e A vizinhança do tigre (2014), de Affonso Uchoa, ambos movidos pela combinação e também pela indiscernibilidade entre os registros ficcionais e documentais. Tanto em um como em outro, a presença indicial do real convive com procedimentos ficcionais que ultrapassam, em muito, os efeitos miméticos da semelhança, alcançada por meio de expedientes distintos. As escrituras desses filmes são guiadas por um duplo movimento: ao mesmo tempo em que, em sua matéria sensível, buscam se impregnar pelas formas de vida das populações periféricas (abrindo-se à duração do cotidiano, aos modos de habitar o espaço e à intensidade dos laços afetivos), também lançam mão de recursos ficcionais que redimensionam os componentes da experiência dos sujeitos filmados, da qual são selecionados determinados aspectos que amparam as construções narrativas. As afinidades entre os dois filmes, entretanto, não devem encobrir aquilo que os distingue. Se em Branco sai, preto fica a fabulação se vale de uma poética da memória que elabora a experiência traumática que marcou a juventude dos protagonistas (a invasão de um baile black pela polícia em 1986, na Ceilândia), A vizinhança do tigre adentra o duro presente dos jovens habitantes da periferia de Contagem, apanhados na tensa e adensada duração na qual os corpos são enquadrados, em uma temporalidade compactada, de horizonte sufocante e estreito. Cada um dos filmes, a seu modo, inventa o território da vida em comum, com suas fraturas e liames, coerções e linhas de fuga. Nos dois, porém, a experiência peculiar dos grupos e populações periféricas (nas regiões da Ceilândia, Brasília, e em Contagem, Minas Gerais) ganha seu relevo sensível sobretudo no âmbito da vida privada, filtrada pelo crivo da subjetividade dos protagonistas. Dessa forma, os traços que marcam as formas de vida dos grupos sociais a que pertencem os protagonistas não vêm simplesmente rebater sobre a subjetividade; na direção inversa, são os componentes da subjetividade que modulam (como se diz em música) as características próprias dos grupos de pertencimento. Enfim, se certo retrato (incompleto e lacunar) dos sujeitos torna-se visível, isso só se dá por meio da performance dos atores, que se valem tanto dos hábitos e das práticas cotidianas, reencenadas, quanto da adoção de estratégias ficcionais (manejadas de maneiras distintas pelos dois filmes). |
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Bibliografia |
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