ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | A reconstrução das imagens: o documentário e o conflito dos fragmentos |
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Autor | Fernanda Rocha Miranda |
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Resumo Expandido | No presente artigo, questões relacionadas ao arquivo, à memória e à montagem no documentário brasileiro contemporâneo, serão analisadas através dos filmes Glauces – Estudo de um Rosto (2001) e Elogio da Graça (2011), de Joel Pizzini. Produções que se destacaram em diversos festivais nacionais e internacionais e que, no atual contexto histórico, oferecem uma alternativa preciosa e resistente ao domínio da cultura espetacular. Filmes que revelam o cineasta como observador atento ao acaso e produtor de sentido, tanto na situação da filmagem como na dimensão poética, inventiva alcançada na montagem.
Em um universo de produção tão acelerado, é curioso perceber o uso, cada vez mais recorrente, de imagens de arquivo em produções audiovisuais. Retomar uma imagem de arquivo é um ato de resistência, é querer se distanciar para compreender tudo o que o acontecimento representa. Em um mundo veloz e saturado de imagens, perguntamo-nos: como e que histórias podem nos contar as imagens de arquivo hoje? Muitos aspectos da obra do cineasta Joel Pizzini nos chamam a atenção e nos convidam à reflexão. Retomando o conceito de “cinema de poesia”, o cineasta realiza documentários que privilegiam a experimentação, as possibilidades da montagem e a poesia, enquanto forma de transgredir as regras impostas pelo cinema clássico. Seus estudos audiovisuais seguem um tipo de vertente documental, em que são tênues as fronteiras com o ensaio. Entender como os filmes de Pizzini ultrapassam os limites do mero registro de uma realidade preexistente é uma das primeiras preocupações desse artigo. Analisaremos questões relacionas ao cinema documentário com ênfase nas questões estéticas ligadas à formação do discurso, e temos como objetivos específicos: 1 ) discutir sobre as propriedades da imagem, tendo em vista a construção do cinema documentário; 2) abordar a questão do real e da representação da realidade, identificando as dificuldades éticas e epistemológicas do cineasta; e 3) contribuir para a reflexão acerca da produção audiovisual brasileira, aproximando a pesquisa teórica às experiências concretas no campo audiovisual. Segundo Walter Benjamin descreve em suas teses sobre a história, o momento histórico é “infinito em todas as suas direções e incompleto em todos os momentos”, sendo os arquivos, e seus intervalos, a representação desta incompletude. Didi-Huberman, depois de Benjamin, viu na montagem a possibilidade de um tipo de conhecimento que nasce da combinação entre os arquivos e suas lacunas – o que Giorgio Agamben chamou de “significantes instáveis”. Com tais conceitos em mente, é importante perceber que o uso das imagens do passado, articuladas em narrativas autorais, resgata a esfera do discurso vivo. Reutilizar uma imagem já existente em outro contexto histórico, confrontá-la com outras perspectives, é também ressignificá-la. Para compreender como o material de arquivo usado nos filme em questão estabelece uma ponte entre o passado e o futuro, gerando reflexões profícuas em relação à sociedade, ao individuo e à arte, buscaremos responder à quatro questões principais: 1) Quais as dimensões que as imagens de arquivo assumem nos filmes que iremos analisar? 2) Qual é a contribuição social desse cinema que se apropria de imagens de terceiros? 3) Como o tempo opera nessas imagens? 4) Qual o papel do cineasta como produtor de sentido na sociedade contemporânea? Os filmes Glauces – Estudo de um rosto e Elogio da Graça de Joel Pizzini foram escolhidos por serem filmes independentes, produzidos fora dos modos industriais de realização e por terem se destacado em diversos festivais nacionais e internacionais. Ambos apresentam uma valorização e um rigor impecáveis em sua composição formal, no ritmo da montagem e, principalmente, no uso de material de arquivo. Estes filmes rompem com as imagens estereotipadas, transformam a compreensão histórica, dão acesso a um mundo desconhecido e nos proporcionam o exercício da interpretação e da reconstrução. |
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Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. Ninfas. Trad. Renato Ambrósio. SP, 2012
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