ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Escritas de si, escritas do outro: Perlov, Mograbi e Suleiman |
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Autor | Ilana Feldman |
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Resumo Expandido | A produção cinematográfica marcadamente subjetiva, performativa ou realizada em nome próprio, na primeira pessoa do singular, tem problematizado os modos pelos quais a subjetividade contemporânea se constitui na imagem e por meio da imagem. Assim, a imagem deixa de ser um lugar de “representação” e de evocação de seu caráter “testemunhal” para se tornar, intensamente, um lugar de “performance” e “autoficção”. Nesse panorama, a inflação ou hipertrofia da subjetividade contemporânea, com o incremento da produção de diários cinematográficos, ensaios audiovisuais, autobiografias fílmicas, autorretratos, “selfies”, testemunhos e confissões de todo tipo, pode ser vista apenas como sintoma da cultura “testemunhal” atual, em uma sociedade mediada pela imagem, mas pode também resistir a esse mundo, ao interrogar as interseções entre as esferas pública e privada, a história e a memória, o privado e o político.
Partindo dos campos teóricos do cinema e da autobiografia, da laicizarão da prática da confissão às contemporâneas estratégias performativas de autoficção, pretendemos examinar as relações críticas que o cinema em geral e o documentário em particular vem estabelecendo com esses domínios, em um percurso da escrita de si à escrita do outro. Para tanto, analisaremos fragmentos de três obras escolhidas, duas documentais e uma ficcional, que, de distintas formas, problematizam nosso hipertrofiado “espaço biográfico”, reivindicando para o cinema uma dimensão pública, interventiva e política. São elas: “Diário 1973-1983” (1985), do brasileiro radicado em Israel, David Perlov; “Feliz aniversário, Mr. Mograbi” (1999), do israelense Avi Mograbi; e “O que resta do tempo” (2009), do palestino Elia Suleiman. As três obras são coproduções realizadas em Israel, país que, marcado por dissensos políticos e conflitos milenares, tem fomentado uma das mais expressivas produções cinematográficas da atualidade. Enquanto na Tel Aviv de David Perlov, o privado é atravessado pelo público e pelo político por meio uma potente montagem que, através das janelas, abre o espaço doméstico da família a um fora (em um meticuloso trabalho de aproximação do que lhe é estranho e de distanciamento do que lhe é extremamente próximo), no cinema de Avi Mograbi, híbrido entre documentário e autoencenação, a ironia, a irreverência e o confronto muitas vezes declarado (entre agentes do Estado e seu próprio personagem) exigem do cinema uma postura de intervenção na cena pública. Já a obra de Elia Suleiman, distanciando-se do documentário, opta por uma notável encenação em que a presença autoficcional do cineasta, como uma espécie de espectro, dá testemunho das transformações de sua cidade de origem (Nazareth, na então Palestina) à luz da biografia de sua família. Nos três casos, embora de maneiras distintas, a identidade de cada um dos realizadores se confunde com a alteridade de seus próprios personagens. Tendo como desafio a investigação de modos políticos de enunciação e subjetivação postos em cena por esses filmes, visamos problematizar, por meio da análise de fragmentos escolhidos, as opções éticas e estéticas que os atravessam. Assim, atenta às particularidades de cada uma das obras, a apresentação terá como itinerário final a discussão acerca das passagens entre o eu e o outro, o privado e o político, o pessoal e o coletivo, a intimidade e a “extimidade”: aquele espaço que, sendo tão próprio aos sujeitos, só poderia apresentar-se fora deles – no âmbito da cultura, no âmbito da relação com a alteridade, no âmbito da exterioridade das imagens. |
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Bibliografia | ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.
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