ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Ditadura no cinema brasileiro formas de agenciar a utopia da história |
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Autor | Cristiane Freitas Gutfreind |
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Resumo Expandido | Esse trabalho faz parte de uma pesquisa que vem sendo desenvolvida desde 2009 com
financiamento do CNPq. Na atual etapa pretendemos discutir como a ditadura militar (1964-1985) é apresentada pelo cinema brasileiro nos últimos dez anos a partir de questões estéticas atreladas a “utopia dos sentimentos” (Kluge, 2014) que se desdobram em dois eixos: a imagem biográfica e a redefinição de filme político. Para o diretor e teórico Kluge (2014), o cinema não é autônomo da sociedade, do contexto midiático e da experiência subjetiva da dimensão sensível que é apreendida pelo espectador. Em sua produção fílmica a justaposição e a correlação de materiais heterogêneos, como imagens de arquivo, cartões, textos ou diálogos, tem lugar fundamental como princípio do cinema que permite ativar o espírito do público. A teoria de Kluge nos possibilita reativar o debate sobre as dificuldades em representar no cinema projetos que, somente através da revolução, poderiam transformar o conjunto das relações entre os homens em uma nova organização do trabalho e da sociedade. Porém, filmar esses projetos, que ganharam força ao longo dos séculos e ao redor do mundo de forma diferenciada, não se mostrou tarefa fácil, recorre-se, frequentemente, ao drama ou melodrama como estratégia estética para aliviar o sofrimento ou opta-se por uma narrativa cronológica de fundo informativo para que se conheça a natureza do objeto. Mas tem-se, também, formas de agenciamento que se distanciam desse modelo e se aproximam da sugestão, do tensionamento de regras técnicas e da criação de um pensamento sobre o real. Os documentários biográficos, formato em evidência na produção recente de filmes sobre a temática da ditadura, utiliza as várias maneiras de agenciamento e nos ajuda a pensar metodologicamente sobre a nossa proposta. Esses filmes são baseados em personagens cuja existência é legitimada pela história e constroem imagens que, por um lado, possibilitam a apreensão da história associada com a “crise das ideologias” que dominam a cena teórica desde os anos 80 e, por outro, temos a história contemporânea dominando o sujeito desses filmes. Ou seja, nesses documentários temos o uso de diferentes níveis de narração, o individual e o político. Percebemos, então, uma característica a ser destacada: a imagem atual, a que a câmera é autorizada a registrar (Benjamin, 1991), se define como a apresentação de uma história que há muito tempo está fora de campo. O sentimento de preenchimento do campo se torna um instrumento contra o domínio de um presente amnésico. O simulacro se torna um elemento constitutivo do real, criando uma tensão permanente entre a imagem e o imaginário, entre o percebido e o memorável, propondo assim, uma ressignificação do filme político. Nos documentários recentes sobre a ditadura, esses realizadores colocam em cena a ruptura de uma história que levou ao fracasso das utopias revolucionárias nascidas no meio do século passado e, através de estratégias estéticas distintas, revelam diferentes faces da militância e o sonho irrepreensível de um outro mundo e de uma incontornável realidade de um fracasso que aparece na concepção profundamente trágica da realidade. Assim, a figura emblemática que desenha o cinema que aborda o tema, é a que trata da ruptura da consciência devastada, marcada em nome de um projeto político utópico que fez com que o filme político considerasse a subjetividade como parte fundamental da sua estrutura na atualidade. Nesse sentido, analisar esses filmes a partir das estratégias estéticas diferenciadas, nos levam a uma reflexão que não dissocia pensar a dimensão temporal das imagens em movimento da sua dimensão comum ao tempo histórico, permite, assim, conduzir a uma reflexão mais ampla sobre a atualidade em sua relação viva com as diferentes temporalidades que justificam as escolhas estéticas marcadas pela subjetividade, utopia e sentimentos. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. A quoi pensent les films. Paris: Séguier, 1996.
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