ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | A autobiografia de Stan Brakhage |
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Autor | Patrícia Mourão de Andrade |
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Resumo Expandido | Em 1973 Stan Brakhage lançou o primeiro capítulo de sua autobiografia fílmica que, inicialmente intitulada Sincerity, levaria ainda dez anos, durante os quais ganharia um segundo e provocativo título, Duplicity, para ser terminada. No primeiro capítulo, Brakhage retraça cronologicamente, e recorrendo a fotografias de família, home movies e trechos de seus filmes iniciais, seus primeiros anos de vida até o início de sua carreira como cineasta. Nas partes seguintes, ele nos apresenta sua esposa, Jane, vemos seus filhos nascerem, reconhecemos o estilo de seu cinema maduro, e identificamos os primeiros sinais de uma crise que, nos anos 1980, levaria ao final de seu casamento.
Quando lança Sincerity, Brakhage já era um cineasta maduro, e figurava, consensualmente, entre os mais importantes do cinema experimental. Cenas familiares não eram estranhas ao seu cinema; nas duas décadas anteriores, ele filmara o parto de suas filhas, relações sexuais, brigas conjugais, e amigos, que, eventualmente, o visitavam nas montanhas do Colorado, onde vivia isoladamente com a família. As manipulações de câmera e de montagem, que, no limite, levavam à abstração dos registros, faziam com que os filmes sustentassem uma espécie de presente perpétuo, no qual as noções de narrativa ou sucessão cronológica pouco faziam sentido. Apesar da familiaridade com o registro caseiro, familiar e altamente pessoal, nada parecia mais distante de Stan Brakhage que a organização linear e cronológica de uma narrativa autobiográfica. Tampouco as imagens mais cruas, de tom documental, sem manipulações de câmera ou na edição, pareciam corresponder ao seu estilo mais reconhecido. Ao invés de continuar um movimento de amadurecimento de um estilo visível entre Anticipation of the Night, Window Water Baby Moving e Dog Star Man – filmes-pilares em qualquer história do cinema experimental norte-americano e que representam marcos inaugurais de tendências estilísticas na época –, Sincerity/Duplicity parece colocar-se em ruptura com esses filmes. Com efeito, a série autobiográfica parece mais próxima de algumas investigações presentes na sua trilogia de Pittsburg, onde documentou três instituições: polícia, hospital e necrotério. Com exceção do último filme (The Act of Seeing with Ones Own Eyes), a trilogia foi altamente criticada pelos críticos que, na década de 1960, fizeram de Brakhage, o principal nome do experimental americano, entre eles Jonas Mekas e P. Adams Sitney. Para críticos como Jonas Mekas, os dois primeiros filmes da trilogia eram uma espécie de recuo, ou recarregamento de energia, diante de um esgotamento estético; para P. Adams Sitney, uma tentativa de escapar ao solipsismo de seus primeiros filmes. Nesta mesma época, Brakhage vinha tendo uma série de desentendimentos e discordâncias, registrados em sua correspondência, tanto com Sitney quanto Mekas a respeito do Anthology Film Archives e particularmente da coleção de filmes que o museu estava criando e de cuja comissão de seleção ele fazia parte. Brakhage questionava algumas das escolhas e sobretudo alguma das ausências, particularmente a do documentário. Nesta comunicação, gostaria de pensar a autobiografia de Brakhage à luz dos debates sobre história do cinema e o estatuto do “documento” na qual o autor vinha se envolvendo em sua intensa troca de correspondências. Também pretendo abordar a autobiografia como forma de inserção neste debate histórico, de criação de uma contra-narrativa na qual o cineasta pôde rever e readequar o cânone no qual ele havia sido colocado por seus pares. |
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Bibliografia | Cartas e documentos inéditos, parte do James Stanley Brakhage Collection, pertencente a University of Colorado Boulder.
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