ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | KUXA KANEMA: O CINEMA E A REVOLUÇÃO MOÇAMBICANA |
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Autor | JANAINA DAMACENO GOMES |
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Resumo Expandido | Como poucos líderes, Samora Machel, o presidente da então independente Moçambique (1975), percebe o poder das imagens e por elas planeja uma nova revolução em seu país. Ela ocorre através do Kuxa Kanema - uma série cinematográfica semanal produzida no formato de um jornal de atualidades - exibido em todos os cinemas e vilarejos de Moçambique. Para chegar a todas as localidades do país, criou-se o cine-móvel, uma kombi adaptada com projetores e telão. Para um local onde a maioria do povo era analfabeta, a imagem significava a oportunidade de visualizar o novo líder, mas também de criar uma ideia de identidade moçambicana que fosse aglutinadora das diversas identidades étnicas e diferenças religiosas existentes nesse país africano. Produzida pelo Instituto Nacional do Cinema, hoje Instituto Nacional do Audiovisual e do Cinema (INAC), a série gravada em 16mm, P&B, permaneceu por 10 anos tentando aproximar e afinar o discurso político de um povo que vivia uma intensa guerra civil. Foram 395 capítulos com discursos de Samora, relatos de ataques das guerrilhas financiadas pela África do Sul ou a discussão sobre a falta de pessoal adequado para a direção de determinadas tarefas, como a guarda de um parque de máquinas agrícolas. Tudo era debatido, seguindo alguns passos da agenda leninista como o da autocrítica. O texto ora apresentado é resultado de viagens de campo e pesquisas realizadas no INAC em Maputo, durante 2014. Kuxa Kanema é uma expressão criada a partir de línguas locais e significa o renascer do cinema após a libertação.
O legado do Kuxa Kanema intersecciona o histórico das lutas pela libertação em território africano com a discussão sobre a dependência colonial, o mundo do trabalho, o socialismo e as questões étnicas e raciais. A discussão sobre a questão étnica é voltada mais pela necessidade de se apaziguar os antagonismos internos existentes entre grupos étnicos do norte e do sul do país. Esses antagonismos limitavam a criação de uma identidade nacional moçambicana. Quanto às questões raciais é de se notar uma tensão entre os brancos portugueses ou de origem portuguesa e a população local negra, o que era pontuado pelo combate ao racismo institucionalizado na vizinha África do Sul, antagonista de Moçambique também na área política pois financiava as guerrilhas antigoverno e contra o pensamento socialista que havia se instalado no país. É possível ver nos documentos oficiais da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), partido político que assumiu o poder no pós-independência, a importância atribuída ao cinema na problematização e resolução de algumas dessas temáticas. Um desses textos pode ser visto nos “Documentos da II Conferência Nacional do Trabalho Ideológico”. Nos anais desta conferência realizada na cidade de Beira, em 1978, encontramos um sub-capítulo intitulado “Resolução sobre cinema”,que apresenta qual o papel que o cinema deve desempenhar a partir de seu caráter revolucionário. Um destes papéis era o de incentivar a produtividade do povo moçambicano. Neste item, encontramos também as avaliações e novas diretrizes para a continuidade da produção do Kuxa Kanema. O cinema revolucionário moçambicano inspirou o trabalho de muitos realizadores daquele país, que acreditavam que este tinha um papel fundamental na constituição do “homem novo” pós-independência, mas também de fora. Não é demais lembrar que Jean-Luc Godard, viajou para Moçambique em 1978 onde permaneceu por algum meses para auxiliar na criação do primeiro canal de TV do país. |
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Bibliografia | ARENAS, Fernando. Lusophone Africa: Beyond Independence. Minneapolis: Univ.of Minnesota Press, 2011.
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