ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Robert Altman: um Van Gogh lúcido no turbilhão hollywoodiano. |
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Autor | Antonio Marcos Aleixo |
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Resumo Expandido | Desde sua estreia como diretor de filmes institucionais, passando por sua experiência na televisão e a fundação de uma produtora, Robert Altman demonstrou uma profunda consciência das relações entre avanços técnico-estéticos e restrições comerciais, definindo uma estratégia política de sobrevivência em um meio profundamente competitivo e consolidando uma carreira que conseguiu harmonizar a qualidade das obras com a perenidade da produção.
Uma passagem brilhante desta trajetória foi o período entre o final da década de 1960 e meados dos anos 1970, uma época em que mudanças na forma de propriedade dos estúdios encorajaram o capital cinematográfico a investir em formas e linguagens em sintonia com o gosto de um público crescentemente fragmentado. Demonstrando uma profunda consciência de que aquela onda de renovação estética seria breve, Altman tratou de aproveitar a liberdade concedida para produzir filmes que incorporavam as transformações da indústria, na forma de releituras de seus gêneros comerciais, de análises críticas dos processos de industrialização da cultura popular e de experimentações temáticas e formais. Com a definição do “blockbuster” e do filme “high concept” como modelos para os anos 1980, uma década em que a indústria do cinema teve de buscar reestruturações que a preparassem para competir com novos suportes para o audiovisual, tais como a TV por assinatura, o vídeo cassete e os jogos eletrônicos, o “cinema autoral” de Altman e de outros artistas que haviam emergido durante a “Renascença Hollywoodiana” rapidamente perdeu espaço, e o diretor passou a dedicar-se a projetos menores para teatro e televisão. Foi justamente por intermédio da televisão que Altman interrompeu um hiato de dez anos e retomou seu projeto cinematográfico. Tratou-se de uma minissérie de quatro horas, para a BBC, contando a vida do pintor Van Gogh. Lançado como filme em 1990, o roteiro traz a marca do olhar materialista de Altman sobre as relações entre arte e mercado. Ao contrário do que sugere o título em português (Van Gogh: vida e obra de um gênio), o Van Gogh de Altman concentra-se no aspecto material do trabalho do artista, a partir de sua conturbada relação familiar/comercial com Theo, seu irmão e marchand. Abrindo com imagens recentes do leilão em que uma conhecida obra de Van Gogh alcança cifras astronômicas, a narração corta para um quarto decrépito no século XIX, onde a conversa entre os irmãos Vincent e Theo é banhada pela voz do leiloeiro, que permanece na trilha sonora por alguns segundos, suavemente desaparecendo, em fade-out. Ou seja, de partida, estabelecem-se relações entre passado e presente, entre as condições de produção da obra de Van Gogh e sua valorização futura, nos circuitos altamente financeirizados do mercado da arte. É interessante notar que, justamente no filme por meio do qual retornava ao mainstream, Altman tenha tematizado a relação do artista com uma série de mediações técnicas e comerciais que tanto asseguram a difusão da obra quanto impõem o esboroamento de seu valor cultural, subsumindo-o aos ditames da valorização financeira. Acredito que tal escolha sinaliza, no caso de Altman, não apenas a retomada de uma carreira, mas também de uma estratégia política, baseada em uma cinematografia altamente consciente e crítica de seus pressupostos. Tendo em vista que o XIX Encontro da SOCINE versará, dentre outros assuntos, sobre “mudanças significativas” trazidas pelas tecnologias digitais, bem como sobre “estratégias políticas de subjetivação” suscitadas por tais processos, proponho contribuir com meus conhecimentos sobre a trajetória de Altman. Acredito que a análise histórica das estratégias adotadas pelo diretor, em outros momentos de re-estruturação da indústria, pode ajudar a pensar os desafios com que deparamos no presente. Para tanto, pretendo organizar minha fala em torno de breves comentários analíticos sobre cenas escolhidas de um dos filmes “autoconscientes” de Altman: "Vincent& Theo". |
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Bibliografia | Biskind, Peter. Easy Riders, Raging Bulls. New York: Touchstone Books, 2003.
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