ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Falsos documentários: subversão nos regimes de verdade |
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Autor | leandro martins borges |
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Resumo Expandido | O gênero documentário, aqui entendido como um gênero que não se restringe somente às telas de cinema, mas cada vez mais presente na televisão, através dos chamados realities, demonstra que os meios de comunicação atuais buscam obras cujo foco central está na captação direta da realidade. Seguindo o pensamento de Slavoj Zizek, podemos considerar essa busca midiática pela realidade como uma conseqüência de um mundo esvaziado, justamente, da realidade. Esse paradoxo é chamado pelo filósofo romeno de espetacularização da realidade. Dentro dos estudos do cinema, podemos articular os conceitos de Zizek ao conceito de pedagogia do real proposto por Beatriz Jaguaribe, com o qual podemos notar como a ficção absorve o uso de estéticas realistas, muitas delas herdadas do gênero documentário, buscando uma legitimidade para abalizar sua visão de mundo. Assim, o documentário, tradicionalmente visto como o cinema da realidade, protagoniza a representação cinematográfica da realidade através de seus métodos e recursos estéticos. Porém, entendemos que os motivos que determinam que um filme seja classificado como documentário estão além dos fatores fílmicos. De acordo com Bill Nichols, a classificação de um documentário obedece a fatores extra-fílmicos, tais como sua aceitação e reconhecimento por parte de cineastas, crítica e público, assim como a sua exibição em festivais e sessões documentárias. Esse reconhecimento do documentário através de aspectos extra-fílmicos possibilita a compreensão de dois sub-gêneros de documentário: mockumentary e falso-documentário. Enquanto o mockumentary é visto como uma paródia do documentário (uma ficção que brinca com a estética documentária, mas que revela no final a brincadeira), o falso documentário apresenta um caráter duvidoso, nunca assumindo seu lado ficcional, gerando dúvidas na crítica e no público acerca de sua legitimidade em termos do uso de uma proposta ficcional. Além de gerar desconfiança, o grande mérito presente em alguns desses filmes (mockumentaries ou falsos-documentários) é a sua capacidade subversiva diante da espetacularização do real. Filmes como o mockumentary televisivo Opération Lune (2002) de William Karel e o falso-documentário Exit Through the Gift Shop (2010) de Banksy apresentam uma crítica subversiva dupla: aos meios de comunicação de massa, incluindo o próprio documentário; e aos temas retratados (em Opération, o aspecto político da operação Apollo 11, e em Exit, o comércio envolvendo a street art).
O documentário contemporâneo cada vez mais refuta a definição de gênero cinematográfico da verdade, indo no sentido oposto à pedagogia da realidade. Algumas obras, através da exposição das técnicas da feitura documentária, demonstram a articulação entre construção discursiva e a verdade, resultando, no primeiro momento, a descrença na própria credibilidade do documentário. Essas obras são chamadas de documentários reflexivos, e neste sentido o falso documentário contribui para quebrar a associação comum entre documentário/verdade e, nos casos analisados, gerar a desconfiança em relação a outros regimes sociais de verdade. A proposta é compreender o falso documentário além de suas questões estéticas, ainda mais quando entendemos que os falsos documentários são produções que visam a mímese, em que se reproduz um modelo já consagrado. Entendemos que a produção documentária, assim como qualquer outro regime de verdade, deve ser questionada e dela devemos suspeitar, e a partir desse questionamento entender que todo discurso social é uma construção; ou seja, o falso documentário, através de sua capacidade de mímese, serve para implodir discursos hegemônicos, de verdades estabelecidas. Dizer verdades através de mentiras é uma estratégia subversiva, em termos nietzschianos, presente nos falsos documentários, capaz de ampliar as capacidades criativas e críticas do documentário contemporâneo. |
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Bibliografia | CAMPOS, Luana Brant. O cinema nas potências do falso – devir e hibridizações, In: Revista Travessias n. 02. UNIOESTE, Paraná, 2008.
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