ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Recontando o devir: a exposição nas narrativas audiovisuais de ficção |
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Autor | Cristiano Figueira Canguçu |
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Resumo Expandido | Desde a década de 1970, a filosofia da literatura tem definido como ficcionais aquelas narrativas que estabelecem um universo de referência próprio, um mundo hipotético no qual se passariam os acontecimentos descritos no texto narrativo (RYAN, 2012). Sendo assim, a afirmação “Sherlock Holmes é um detetive que reside em Baker Street, Londres”, embora falsa em nosso próprio mundo, seria verdadeira no mundo possível em que se passam as histórias deste personagem.
Tais narrativas não precisam criar, a partir do nada, todas as informações, regras, entes e acontecimentos desses mundos, visto que elas operam por adição e, eventualmente, por contradição, à totalidade do nosso conhecimento de nosso próprio mundo: à nossa enciclopédia (ECO, 1983). Entendemos as histórias escritas por Conan Doyle porque já sabemos o que é um detetive, que Londres é uma grande cidade na Inglaterra e que esse país, que na Era Vitoriana as pessoas andavam de carruagens, etc. Sendo narrativas ficcionais, as histórias de fantasia e de ficção científica funcionam sob o mesmo princípio, embora noutro grau: em seus mundos possíveis, não são adicionados apenas os personagens e acontecimentos fictícios, mas são estabelecidas algumas diferenças importantes em relação ao nosso mundo (TODOROV, 2003): a magia existe e é visível e poderosa, embora seus praticantes o façam em segredo (Harry Potter); ou a viagem no tempo é possível e praticada, o que cria consequências variadas (Doctor Who); ou a engenharia genética dos cidadãos torna-se uma realidade corriqueira, o que transforma a sociedade (Gattaca); ou a população humana entra em contato com uma inteligência alienígena maior que a nossa própria, e portanto incompreensível (2001, uma oddisséia no espaço). Para diferenciá-los dos mundos possíveis das ficções em geral, universos com tais mudanças estruturais são chamados de mundos estruturalmente possíveis (ECO, 1989). Sendo assim, toda narrativa ficcional, de alguma maneira, explica ao destinatário (leitor ou espectador) quais são seus entes e acontecimentos prévios, bem como, no caso dos mundos estruturalmente possíveis, suas regras próprias e distinções em relação à enciclopédia do destinatário. Essa função ou tipo textual (CHATMAN, 1978; AUMÜLLER, 2014), à qual se dá o nome de Exposição (STERNBERG, 1978; GENETTE, 1995; BORDWELL, 1985), pode ser realizada em diferentes momentos da história, buscando criar reações diferenciadas: muitas vezes (porém nem sempre) ela se concentra nos momentos iniciais das narrativas, explicando com clareza o contexto inicial daquele mundo possível (ex: Metrópolis, Guerra nas Estrelas); outras narrativas postergam a exposição para o meio ou o fim (Matrix; Cidade das Sombras); e há ainda a possibilidade de pulverizar a exposição em vários momentos narrativos (Alphaville, O homem duplo). No caso das narrativas audiovisuais, tal função tem sido tradicionalmente cumprida por um conjunto de técnicas (MOURA, s.d.): letreiro, narração em voz over, diálogos, a mise-en-scène (cenografia, figurino), flashback, canção ou mídias do universo ficcional (telejornais, anúncios publicitários, livros de história, hologramas, etc.). Propõe-se, assim, apresentar uma análise comparativa de formas de se construir a exposição em diferentes subgêneros dos filmes de ficção científica: o deslocamento da exposição em diferentes momentos da narrativa afeta as hipóteses do público sobre a história, lhes dando mais ou menos informações com que se basear e predispondo mais curiosidade ou suspense; bem como o emprego de técnicas audiovisuais distintas pode ser usado com o fim de se criar tonalidades emocionais distintas (comicidade, tensão, compaixão), resultando numa variedade de estilos na ficção científica audiovisual. Deste modo, defende-se aqui que a compreensão da variedade dos mundos possíveis estabelecidos nos filmes de ficção científica implica em dar atenção aos modos pelos quais tais mundos são construídos narrativa e plasticamente. |
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Bibliografia | AUMÜLLER. Text-Types. In: HÜHN, P. et al (Orgs.). The Living Handbook of Narratology. Hamburg: Hamburg U., 2014.
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