ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | O Rei da Vela, um filme dos anos 1980 |
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Autor | Elizabeth Maria Mendonça Real |
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Resumo Expandido | As filmagens de "O rei da vela" iniciaram-se em 1971, quando a peça foi remontada em uma retrospectiva dos trabalhos do Oficina no Rio de Janeiro, mas o filme só foi finalizado em 1982. Durante esse período, José Celso enfrentou uma série de dificuldades que o impediram de prosseguir com a realização do filme, inclusive a prisão e o exílio. Ao retornar ao país, juntou-se ao curta-metragista Noilton Nunes para continuar o trabalho. Noilton, que no filme foi codiretor e montador, sugeriru romper com a linearidade da peça. Assim o filme inicia pelo seu último ato e se constrói a partir de materiais diversos: cinejornais, filmes familiares, manchetes de jornais, capas de revistas, fotografias, faixas e cartazes de protesto, vídeos e encenações da peça ao ar livre. A trilha musical segue o mesmo estilo de colagem, juntando música erudita e popular. Problemas para conseguir recursos da Embrafilme levaram José Celso a montar um despacho na sua sede. No lançamento do filme, no antigo cinema Ricamar em Copacabana, a equipe preparou um banquete nos moldes de uma cerimônia do candomblé.
Segundo Noilton, o filme foi finalizado quando começava a detonar no Brasil uma possibilidade de chegarmos a uma democracia mais aberta, mais plural.O manifesto do Teatro Oficina, escrito por José Celso, quando o grupo ainda ensaiava a peça, em setembro de 1967, declarava que em suas novas montagens, no espaço cênico reconstruído após o incêndio que destruíra as suas instalações em 1966, o que interessava ao grupo teatral era atualizar sua visão do Brasil, especialmente do Brasil pós-1964: “o problema é do aqui e agora'. E o aqui e agora foi encontrado em 1933, n'O Rei da Vela de Oswald de Andrade”, afirmava José Celso. O filme não se detém ao texto de Oswald, mas mergulha na própria história do grupo Oficina, na trajetória de José Celso, no processo de produção do filme e no contexto político e cultural brasileiro, incluídas aí as querelas do setor cinematográfico da época. Explode em muitas direções, como um painel poético que se constrói na desordem de um fluxo vertiginoso da memória. O tom do filme, saturado de elementos visuais e sonoros, varia do humor sarcástico oswaldiano ao riso mais safado da chanchada, da poesia cotidiana dos filmes de família à seriedade das passeatas dos trabalhadores e da marcha dos conservadores pela família; da alegria anárquica e revolucionária do grupo de atores banhando-se nu no mar ao clima pesaroso da repressão policial típica da ditadura. Toda essa fragmentação configura contradições que marcaram a década em que foi finalizado o filme. Os anos 1980, período de transição, foram pontuados por um sentimento de perplexidade diante das transformações do país. Segundo a professora Heloísa Buarque de Hollanda, dentre questões importantes para a formulação do projeto cultural que se delinearia naquela década, destacavam-se algumas que pareciam recorrentes: “a atuação imaginativa no interior de espaços legitimados”, “o diálogo com áreas e grupos diversificados”, “a releitura dos clássicos”, “a urgência da reavaliação e do remapeamento”. Outro aspecto importante que marcou a discussão na virada da década (detectado por Carlos Diegues na famosa entrevista em que denunciava as “patrulhas ideológicas”) foi a redefinição do papel do intelectual ou do artista frente às mudanças que se sucediam no Brasil e no mundo, não apenas no âmbito político e econômico, mas também no cultural. A reabertura impunha um posicionamento do intelectual. O fracasso do projeto transformador que marcou os anos 1960 com o golpe militar e a derrota arrasadora sofrida pela guerrilha posteriormente tornaram mais intenso e doloroso esse movimento de revisão. Todos esses aspectos podem ser utilizados como balizas para a análise do filme "O Rei da Vela", uma obra que une momentos emblemáticos da cultura brasileira, como o Modernismo e o Tropicalismo, e que também é marcada pela vontade de revitalizar a cena cultural da abertura política brasileira. |
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Bibliografia | -ANDRADE, Oswald de. "O Rei da Vela". São Paulo: Globo, 2003
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