ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Engajamento, experimentação e contestação nas formas fílmicas do contra |
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Autor | Naara Fontinele dos Santos |
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Resumo Expandido | A contrainformação fílmica supõe e coloca em prática uma indissociável imbricação entre a experimentação estética e a contestação de determinados discursos dominantes pelos próprios meios do cinema. A presente proposta tem por intenção abordar a história da contrainformação fílmica e seu vasto campo de invenção formal. Pretende-se, num primeiro momento, indicar uma breve cartografia das mais exemplares iniciativas fílmicas de contrainformação, partindo das formas de propaganda revolucionárias às práticas coletivas dos anos 70 : o grupo francês Cinéma du peuple, cujo um dos co-fundadores foi Eugène Bonaventure Vigo, pai de Jean Vigo (1913) ; o grupo percursor Kinok de Dziga Vertov e suas “atualidades cinematográficas” Kinodélia e Kino-pravda ; o Ciné-train d’Alexandre Medvedkine (1932) ; o americano Frontier Films de Paul Strand e Leo Hurwitz (1930) ; o grupo Ciné-liberté na França (1936); os “clipes-revolucionários” inventados por Santiago Alvarez em Cuba (1960); o News reel de Robert Kramer (1967); Les États Généraux du cinéma na França, com as iniciativas Ciné-Tracts, a série On vous parle de… (Nós vos falamos de…) e o grupo Medvedkine, co-fundados por Chris Marker (1968) ; o grupo argentino Ciné Libéracion de Fernando Solanas e Octavio Getino (1968). No ensejo dessas experiências revolucionárias da história do cinema, pensaremos os filmes Iracema, uma transa amazônica (1974) e Gitirana (1975), de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, como duas iniciativas coletivas de contrainformação, inscrevendo-as na extraordinariamente rica cartografia das formas fílmicas do “contra”.
Realizados pela mesma equipe e experimentando os mesmos procedimentos de filmagem, ambos os filmes foram financiados pelo canal de televisão alemão ZDF e exibidos no Festival de Cannes em 1976. Iracema figura em diversas historiografias do cinema brasileiro como um dos mais importantes filmes realizados durante a ditadura brasileira. Gitirana integrou diferentemente essas historiografias, sendo raramente mencionado e restando pouco conhecido. Iracema e Gitirana foram realizados no auge da euforia desenvolvimentista e colocam em cena dois grandes projetos do “Plano Nacional do Desenvolvimento”, situados em regiões de Segurança Nacional : a inacabada Transamazônia e a construção da barragem e da usina hidroéletrica de Sobradinho (Juazeiro e Petrolina). No gesto de abordar tais regiões - de produzir images dotadas de um ponto de vista crítico, irônico e contestador –, os filmes definem uma atitude de cinema que recusa os limites impostos pelo regime militar e confrontam a “desinformação” oficial. Além do engajamento na elaboração da contrainformação e da contra-história, o processo de criação fílmica de Iracema e Gitirana abrigam potencialidades em torno da construção de um gesto político que se manifestam : no distaciamento quanto aos modos de representação tradicionais, na relação dialética entre atores/personagens, nas mutações da narrativa em função da realidade filmada, nas alianças entre a reportagem e a invenção, a vida e a mise-en-scène. Na observação dos filmes Iracema e Gitirana, associados as pungentes manifestações de contra-história fílmica, pretende-se indicar o que essas experiências históricas nos ensinam em relação a organização prática, ao trabalho formal e a difusão da contrainformação. |
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Bibliografia | BRENEZ, Nicole. Cinémas d'Avant-Garde, Cahiers du Cinéma, 2007.
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