ISBN: 978-85-63552-17-4
Título | Pequenas formas: a redução minimalista e o recomeço do cinema na arte contemporânea |
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Autor | osmar gonçalves dos reis filho |
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Resumo Expandido | Nos últimos anos, temos identificado na produção audiovisual uma série de trabalhos que parecem compor uma certa constelação, uma família ainda que instável, no modo como compartilham certas temáticas e modos de abordagem. Trata-se de obras curtas, breves, constituídas por poucos planos, por pequenos blocos de espaço-tempo, pequenos segmentos de imagens arrancados ao fluxo da vida. Marcados por uma retórica da sutileza e pelo despojamento da linguagem, esses trabalhos se instalam numa zona de fronteira, no limiar entre cinema e artes plásticas, entre um certo registro documental e um investimento de ordem plástica, poética, formal.
Para “artistas-cineastas” como Agnes Varda e Abbas Kiarostami, o que está em jogo nessas pequenas formas é possibilidade de “não contar uma história”, de produzir um cinema “incompleto e inacabado”, no qual o espectador possa intervir para preencher os vazios e as lacunas. Um cinema onde a história seja reduzida a seu grau zero, seja apenas um esboço de história. Cinema envolto em magia, mistério, silêncio. É o que fazem Ange Leccia e Rineke Dijksta. Em duas exposições recentes ocorridas em Paris, eles apresentaram La mer (2004-2015) e The Gymschool (2014). Duas instalações que se voltam para a superfície do cotidiano, para eventos simples, banais, como o movimento incessante das ondas no mar e o treinamento extenuante de pequenas aspirantes à bailarina. Em ambos os casos, um olhar distendido e silencioso parece revelar a potência que se resguarda naquilo que nos é mais comum, a possibilidade do poético no que se apresenta habitualmente como insignificante e trivial. Nesse artigo, no entanto, gostaríamos de pensar não exatamente esse sublime em tom menor (Denilson Lopes), essa possibilidade de reencantamento do mundo pelo banal, mas dois gestos que parecem estar associados a ele. De um lado, um retorno aos primórdios do cinema, às suas origens. Um retorno que se faz não sob o signo do pastiche e da citação, tão marcante no cinema dos anos 80’s, mas a partir de uma volta aos seus procedimentos, a seu sentido primeiro, sua vocação original. De outro, a afirmação de uma “estética da presença”, de um retorno às coisas mesmas, a vontade de uma relação mais imediata e sensorial com o mundo. O primeiro cinema (1895-1905), sabemos, tinha como atração o movimento real do mundo e celebrava o fato que a vida podia ser efetivamente captada em imagens. Destacava, assim, a beleza dos gestos e dos corpos em movimento, enfatizando a própria “realidade da presença”, a sensação de proximidade e relevo proporcionadas por esses corpos filmados – algo que viria a desaparecer gradualmente do universo do cinema, quando as lógicas conjuntas da narração e do realismo tornaram-se hegemônicas. Pois bem. Nesse momento em que discutimos o cinema em redes e nos indagamos “o que resta do cinema” nas novas plataformas e práticas digitais. Nesse momento em que muitos conceitos parecem apontar para espécie de supressão do cinema provocada por sua própria expansão (beyond cinemas, pós-cinema, future cinema etc) vemos inúmeras obras regressando às origens, ao ponto de partida do cinema. Pequenas formas construídas a partir de poucos planos, de planos fixos e frontais (planos Lumière) que abdicam da decupagem, dos movimentos de câmera, das figuras de expressão, reduzindo a cinematografia à sua essência ontológica. Nesse trabalho, gostaríamos de pensar o que leva esses “artistas-cineastas” a uma tal rarefação dos códigos, a buscar esse grau zero da expressão? O que estaria em jogo nessa “nova simplicidade”, nesse retorno à “essência”, a uma definição tão minimalista e despojada do cinema? Nosso intuito aqui é investigar as dimensões éticas e estéticas desse retorno a partir de um diálogo com as obras La mer (2004-2015), de Leccia e The Gymschool (2014), de Dijkstra. |
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Bibliografia | Referências bibliográficas
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