ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | Silêncio e Sinestesia na Narrativa Cinematográfica |
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Autor | Yasmin Pires Ferreira |
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Resumo Expandido | A estética sonora, em seu percurso de desenvolvimento e compreensão, recebeu atribuições diversas. Em um primeiro momento, foi vista como mero acompanhamento musical para reforçar as emoções postas em cena, ou ainda o simples registro e organização de diálogos e ruídos. Hoje, o nível de complexidade que sua elaboração pode alcançar e o seu papel central na linguagem cinematográfica é fato irrevogável para os pesquisadores da área. Dentre os recursos que compõem esse domínio acústico, destaca-se o silêncio como um elemento peculiar.
Em busca de uma análise detida dos efeitos que o silêncio fílmico exerce na percepção do espectador, a pesquisa sugere que ele seja portador de potencial sinestésico, ou seja, que ele possa suscitar no público uma experiência multissensorial quando aplicado em certos contextos narrativos, tanto no cinema “mudo” como contemporâneo. Partindo de uma compreensão da construção cultural da escuta (SCHAFER, 2011) e da noção cageana de silêncio (CAGE, 1961), são levantados exemplos capazes de explicitar o fenômeno enfocado, bem como a linguagem audiovisual que o provoca. Nessa perspectiva, a começar pelo cinema “mudo”, tem-se como subsídio as investigações propostas por Melinda Szalosky (2002), quem confere uma propriedade sinestésica às imagens silenciosas por meio de uma espécie de visualização dos sons que saltam da tela. A aplicação disso pode ser verificada no trabalho de grandes cineastas do período, como em A Greve de Sergei Eisenstein (1925), onde na cena de um tumulto, é inserido o close de uma sirene repetidas vezes para lembrar o espectador de que ela ressoa constantemente enquanto a ação se desenvolve (MANZANO, 2010). Para a autora, por meio de uma disposição mental, somos capazes de escutar o ressoar da sirene na medida em que a imagem se configura como um estímulo acústico, desencadeando uma percepção auditiva em meio à situação silenciosa. O mecanismo através do qual apreendemos o som de imagens silenciosas é intrínseco à noção de sinestesia, uma vez que a percepção de um estimulo visual transmuta-se em uma sensação auditiva. Este forte apelo do silêncio constitui uma possibilidade de expressão que lida com a ausência de banda sonora característica daquele período, seja por meio da montagem, fotografia, atuação, ou mesmo manipulando os grafismos dos intertítulos. Diante dessa ideia, alarga-se a proposta de Szalosky no intuito de investigar os modos de utilização do silêncio no cinema para além dos seus primórdios. Atualmente, munidos de sonorização, os filmes buscam o silêncio como uma opção estética, não mais em decorrência de uma limitação técnica (CAMPER, 1985). Para tanto, os cineastas contemporâneos articulam elementos de todos os domínios da linguagem audiovisual para representá-lo imagética e acusticamente. Comumente, reforçar as noções de vazio, solidão e morosidade na mise en scéne comungam com este propósito. Vemos, por exemplo, que em Luz Silenciosa de Carlos Reygadas (2007), o silêncio emerge representado pelo plano sequência, pela luz e flares, pelo laconismo dos personagens, assim como pelos sons pontuais e reverberados na trilha. Esses elementos contém em si qualidades silenciosas que conferem à obra a impressão de suspensão de ruído (TEREZANI, 2013). Assim, vê-se que em busca da representação do silêncio, o cinema pode promover uma experiência sinestésica que suscita a dimensão imaginativa do espectador ao propor que ele interprete um conjunto de estímulos visuais como um aspecto sonoro. Logo, o silêncio parece nos convidar a ver os sons e a ouvir as imagens (COSTA, 2000). |
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Bibliografia | CAGE, John. Silence. Ed 1. Connecticut: Wesleyan University Press, 1961.
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