ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | Cinema e pintura em "Um Pombo..." (2014), de Roy Andersson |
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Autor | Raquel Assunção Oliveira |
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Resumo Expandido | Desde seu surgimento, o cinema tem sua história atravessada por aproximações, flertes e intersecções com a pintura. Observamos essa relação desde os antigos filmes em branco e preto pintados à mão; passando pelas parcerias de pintores colaborando com a produção cinematográfica – relembremos a célebre parceria no filme Spellbound, de 1945, dirigido por Hitchcock e cuja cenografia foi assinada por Salvador Dalí; pelas histórias de grandes nomes da pintura dando mote para cinebiografias (vide Sede de Viver, de 1959, dirigido por Vincente Minelli, sobre Van Gogh); até mesmo por meio da fotografia ou de cenas e detalhes de filmes inspirados por quadros, como é o caso da casa dos Bates em Psicose (1960), extremamente semelhante à do quadro Casa Junto à Rodovia (1925), de Edward Hopper.
Neste artigo nos centraremos no estudo da produção contemporânea Um Pombo Pousou Num Galho Refletindo Sobre a Existência (2014) que, junto com Vocês, os Vivos (2007) e Canções do Segundo Andar (2000), compõem a Trilogia do Ser Humano, dirigida pelo sueco Roy Andersson. Nosso interesse está em entender de que forma o cinema e a pintura, com suas distintas temporalidades, dialogam entre si, através do conceito trabalhado por Jacques Aumont de instante pregnante e do embaçamento das noções de moldura e máscara, trazidas por BAZIN (1991). Aqui, vale ressaltar que todo o trabalho será realizado de modo a evitar o perigo de subordinar uma das artes à outra, levando em conta a opinião de BAZIN (1991, p. 176) de que “o cinema não vem ‘servir’ ou trair a pintura, mas acrescentar-lhe uma maneira de ser”. Um Pombo, que tem como proposta levantar um olhar sobre a existência humana que seja ao mesmo tempo reflexivo, panorâmico - como de um pássaro – e preocupado, é construído através da montagem de uma série de planos-tableau (AUMONT, 2000 apud OLIVEIRA, 2013). Estes planos são unidades de ação e dramaturgia que se assemelham à visão frontal e fixa que temos de um palco cênico (OLIVEIRA, 2000, p. 190). Tais planos, aliados às cenas em plano-sequência, ao empobrecimento dramático - no sentido de a duração da cena equivaler à duração real (AUMONT, 2013) -, à fotografia e direção de arte milimetricamente calculadas, carregando os cenários de uma mesma paleta de cores e textura, além dos figurinos e maquiagem pensados em conjunto e dos enquadramentos que buscam contemplar a mise-en-scène em sua totalidade, aproximam o filme da tradição pictórica ocidental. Em filmes como Um Pombo a imagem cinematográfica deixa de ser apenas centrífuga, como delimita BAZIN (1991), para carregar também certa medida de força centrípeta, levando o nosso olhar para passear dentro do quadro, como é típico da nossa postura frente a uma pintura. No filme em estudo, a sucessão de planos-sequência estáticos nos leva ainda ao conceito trabalhado por AUMONT (2011) de instante pregnante: a busca por representar um acontecimento (portanto espacial e temporal) num só plano, iluminação e gestualidade que resumam da melhor forma aquela ação – por sinal, uma tentativa fadada ao fracasso, como todas aquelas que tentam capturar o tempo (aqui incluímos a pintura). No caso do filme, enxergamos o conjunto das suas características aqui já mencionadas (textura da imagem, enquadramento, etc.) como uma escolha estética e narrativa que aproxima o cinema da arte pictórica. |
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Bibliografia | AUMONT, J. A imagem. Campinas, SP: Papirus, 2012.
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