ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | O futuro em curto-circuito: Branco Sai, Preto Fica |
|
Autor | Alfredo Luiz Paes de Oliveira Suppia |
|
Resumo Expandido | Branco Sai, Preto Fica (2015), de Adirley Queirós, mescla documentário e ficção científica para discutir a cidadania e os direitos civis sob a alça de mira do estado. Vencedor do Festival de Brasília de 2014, este longa-metragem recorre ao artifício da viagem no tempo para tratar de um fato real ocorrido em meados dos anos 1980, quando policiais invadiram o Quarentão, baile de black music organizado na periferia da capital federal, para agredir violentamente os jovens negros frequentadores do evento.
Branco Sai, Preto Fica (BSPF) é um filme paradigmático dos fenômenos do circuit bending e da ficção científica de fronteiras (borderlands science fiction) pelos seguintes motivos. Circuit bending porque se trata de um filme híbrido de documentário e ficção científica, feito com verba concedida a partir de um edital público destinado à realização de filmes documentários. Além disso, BSPF recorre a toda sorte de circuit bending narrativo, cenográfico e da mise-en-scène no sentido de provocar o estranhamento cognitivo (Suvin 1979) em paisagens e circunstâncias aparentemente familiares e corriqueiras. Como um amálgama de documentário e ficção científica, BSPF é também um filme limítrofe, híbrido em termos de gênero e regime de representação, e cuja fábula se situa num território de fronteira, aquele que separa Brasília, a capital federal, do município de Ceilândia, endereço da classe trabalhadora. Narrativa fronteiriça entendida aqui como borderlands science fiction, de acordo com a proposta de Lysa Rivera (2012), BSPF soma-se a filmes latino-americanos anteriores de ficção científica cujas fábulas também se situam em zonas de fronteira, casos de La Sonámbula (1998), de Fernando Spiner, ou Sleep Dealer (2008), de Alex Rivera, entre muitos outros. Nossa hipótese é a de que esses borderlands science fiction films (filmes de ficção científica de fronteira) têm oferecido, ao longo dos últimos anos, uma “moldura” narrativa e uma “paleta de cores” bastante úteis à representação, à problematização e até mesmo ao ensaio sobre temas da agenda contemporânea, notadamente o recrudescimento dos nacionalismos, a xenofobia, o acirramento do estado policial, os rearranjos em termos de fluxos migratórios internacionais e a convivência multiétnica ou multicultural. Também faz parte desta hipótese a suspeita de que, com sua ficção especulativa ambientada em geografias limítrofes ou transicionais, os filmes de ficção científica de fronteira têm recorrido com frequência, direta ou indiretamente, a preceitos marxistas e à estética documentária em sua problematização do futuro próximo. BSPF pode ser reivindicado também como representativo de um cinema brasileiro de FC lo-fi na medida em que se apresenta como um filme de FC de orçamento modesto e extração realista, que prescinde de efeitos visuais sofisticados e que faz menção explícita a um “paradigma analógico”, a um contexto low-tech de reapropriação e ressignificação dos resíduos industriais ou do lixo tecnológico, aludindo a um futuro igualmente low-tech e ruinoso em sua “programação visual”. A exemplo de outros filmes comumente associados ao lo-fi sci-fi - tais como Pi (Darren Aronofsky, 1998), Take Shelter (Jeff Nichols, 2011), Love (Will Eubank, 2011), Sound of my Voice (Zal Batmanglij, 2011), Another Earth (Mike Cahill, 2011), ou ainda Upstream Color (Shane Carruth, 2013) – BSPF opera uma “sensação de maravilhoso” (sense of wonder) baseada em desafios intelectuais que não raro dialogam de forma intrigante com o mundo histórico contemporâneo. Em resumo, este trabalho pretende analisar o filme Branco Sai, Preto Fica (2014), de Adirley Queirós, à luz dos conceitos contemporâneos de circuit bending, borderlands science fiction e lo-fi sci-fi. |
|
Bibliografia | CAUSO, Roberto de Sousa. “Tupinipunk – Cyberpunk Brasileiro”. Papêra Uirandê Especial # 1: Tupinipunk. São Paulo: edição do autor, pp. 5-11, 1996.
|