ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | Formação estética em salas universitárias de cinema |
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Autor | Cíntia Langie Araujo |
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Resumo Expandido | A proposta deste trabalho é apresentar os primeiros resultados de uma pesquisa sobre formação estética em salas universitárias de cinema, que adota como lócus o Cine UFPel, sala da Universidade Federal de Pelotas, posta em funcionamento em 2015, sob nossa coordenação. Tal investigação tem como objetivo relacionar política de programação com processos de subjetivação, considerando o cinema brasileiro de autor como dispositivo formador e como vetor para o movimento do pensamento.
As salas de cinema universitárias, do modo como concebemos, são espaços alternativos que operam vazamentos no sistema comercial de distribuição. Atuam como linhas de fuga, quebrando o conjunto de significações dominantes e a ordem estabelecida de controle hegemônico da mídia de massa (DELEUZE, 2013). Mais especificamente, as salas alternativas são aquelas que dão espaço aos filmes mais artísticos e inovadores, e que atuam por outro regime que não o do lucro, como as salas comerciais, a maioria destas localizadas nos shopping centers de grandes cidades. Nesse sentido, versamos sobre potencialidades de uma curadoria criativa em salas universitárias e gratuitas. O Cine UFPel prioriza filmes brasileiros de autor, contemporâneos, que apresentem temáticas sociais ou artísticas. Segundo Xavier (2003, p. 9), cinema de autor é aquele que confronta “os filmes que adotam os padrões consagrados da indústria cultural, seja Hollywood ou a novela da TV”. São obras cujos roteiros partem, normalmente, de projetos pessoais dos cineastas, filmes que minimizam as regras da narrativa clássica e abordam temáticas relevantes da atualidade, como desigualdades sociais, gênero e cultura brasileira. Para Xavier (2008), a narrativa padrão, clássica, se encontra no cerne da hegemonia cultural. Trata-se de um controle do próprio gosto das plateias, que são contaminadas desde cedo com este tipo de obra feita em estúdio, mais especificamente em Hollywood, com um padrão de acabamento que significa muito investimento financeiro. A curadoria do Cine UFPel busca operar resistência a essa hegemonia, ao democratizar o acesso ao filme nacional. Formação estética é aqui entendida pela perspectiva de Rancière (2012), ou seja, não apenas como forma de transmissão de conteúdos pelo audiovisual, mas como uma prática em que se incorporam as dimensões sociais e políticas da arte, através de uma curadoria que busca a emancipação do espectador. Emancipar o espectador, para Rancière, é potencializá-lo para o pensamento, oferecendo a ele acesso a uma obra de arte mais provocativa, que o tire de sua zona de conforto, ao provocar choques pelo inesperado. A análise de alguns filmes brasileiros exibidos no Cine UFPel, demonstrou-nos que as temáticas das obras e a inovação de linguagem podem estar relacionadas a processos de apossamento de si, como na perspectiva feminista de Quase Samba (Ricardo Targino, 2015), e movimentação do pensamento, como no roteiro inovador de Ventos de Agosto (Gabriel Mascaro, 2014). Segundo Comolli (2008), entrar em contato, preferencialmente de forma periódica, com bens simbólicos que abordam temáticas mais próximas da realidade dos espectadores é uma forma de afirmar as subjetividades. Alguns filmes brasileiros de autor favorecem uma experiência mais singularizada, ao apresentarem, de forma diferente e criativa, temas, personagens e cenários nacionais. Logo, na direção teórica adotada, isso está relacionado com apossamento de si e afirmação de subjetividades. Nesse sentido, nossa pesquisa contribui para o desenvolvimento da área de formação estética ao relacionar filmes brasileiros com processos de constituição dos sujeitos na diferença (GUATTARI, 1992). Se criar é resistir (DELEUZE, 2013), programar filmes fora do padrão clássico também é resistir. Assim defendemos uma política de curadoria em salas universitárias que valorize processos de subjetivação singularizados, tentando minimizar o empobrecimento do pensamento com o clichê do cinema hegemônico. |
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Bibliografia | COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder. A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
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