ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | A iconografia do sofrimento na pintura e no cinema: Goya e Godard |
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Autor | Gabriela Machado Ramos de Almeida |
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Resumo Expandido | Na série História(s) do cinema (1988 e 1998), um tema recorrente preocupa Jean-Luc Godard: a impossibilidade das imagens – especialmente do cinema – de representar devidamente determinados acontecimentos do mundo histórico, sobretudo catástrofes do século XX, como o Holocausto.
Godard se refere algumas vezes na obra à ideia de “mostrar para fazer compreender”. Se o século XX é o século do cinema e “a grande história é a história do cinema, maior do que todas as outras porque ela se projeta” (como afirma o cineasta no episódio 2A), para ele também é imprescindível refletir sobre a ausência do cinema quando ele deveria ter se feito presente. Não é que Godard desconheça tudo o que foi produzido de imagens de catástrofes, mas é justamente por conhecê-las que considera que a existência de uma infinidade de discursos visuais e audiovisuais de diversas naturezas não significa que um episódio como o Holocausto tenha sido devidamente mostrado e, consequentemente, compreendido. Didi-Huberman (2010 e 2012) também se interessa pela questão e questiona: como dar legibilidade a imagens de violência que são paralisantes, imagens diante das quais muitas vezes não conseguimos nem mesmo repousar os olhos? Existe, para o autor, uma diferença entre visibilidade e legibilidade – que surge, inclusive, na fala de Godard transcrita acima. Ela corresponderia, numa explicação muito breve, à distinção entre o “mostrar” e o “mostrar para fazer compreender”. A partir de uma interpretação do conceito de “epifania negativa” formulado por Susan Sontag (2004), Didi-Huberman afirma que “é preciso olhar duas vezes para elas [as imagens] para extrair uma legibilidade histórica dessa visibilidade tão difícil de sustentar” (2010, p. 19). A noção de legibilidade é tomada emprestada de Benjamin e diz respeito a ler o que nunca foi escrito. Assim, se as imagens de catástrofes são capazes de paralisar em sua visibilidade, ao olhar para elas nos dias de hoje nos vemos presos a outro aspecto, que é a sua inerente falta de legibilidade, a dificuldade que temos de compreendê-las como imagens dialéticas. Ocorre que Godard, diante deste impasse que se coloca em nível ético e estético, recorre a alguns expedientes. Como apanhado não-historiográfico da história do cinema e, em alguma medida, também da Europa no século XX, a série História(s) do cinema é produzida com sequências de colagens em que são associadas imagens fotográficas e fílmicas (da ficção e do documentário); reproduções de pinturas, desenhos e gravuras; poesias, textos filosóficos e obras literárias; imagens do próprio Godard em sua biblioteca ou sentado diante de sua máquina de escrever, além de um conjunto de sons que inclui ruídos, vozes e músicas. Francisco de Goya é o pintor com mais obras expostas em História(s) do cinema (Scemama, 2006). A compreensão do interesse e da retomada de Goya por Godard a partir do instrumental teórico-analítico indicado é o que interessa especificamente ao trabalho. Se não há, para o cineasta, uma forma de visibilidade que tenha conferido a legibilidade necessária ao real que brota para além do dizível e do imaginável, como no caso do Holocausto, que contribuição Godard oferece, para além da sua crítica, na representação que ele próprio produz? Parte-se da premissa de que há uma iconografia do sofrimento em Goya que interessa a Godard, convocada especialmente nos momentos de História(s) do cinema em que o cineasta questiona o lugar do cinema frente à história. É como se a obra de Goya, especialmente algumas gravuras extraída das séries Caprichos e Desastres da guerra e os quadros Saturno devorando seu filho e 3 de maio de 1808 em Madri compusessem, para Godard, parte de uma iconografia possível para representar o sofrimento do qual ele considera que o cinema não deu conta – e, assim, ajudar a construir para alguns fatos históricos uma outra legibilidade. O trabalho se dedicará especificamente aos trechos da série em que estas obras de Goya aparecem, no episódio 1A. |
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Bibliografia | DIDI-HUBERMAN, Georges. Remontages du temps subi - L'oeil de l'histoire, 2. Paris: Minuit, 2010.
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