ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | PENSAR O CONFINAMENTO DA PALAVRA NA OBRA DE JONAS MEKAS |
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Autor | RAFAEL ROSINATO VALLES |
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Resumo Expandido | Pensar a questão da palavra na obra do escritor e cineasta Jonas Mekas, possibilita diversos recortes temáticos e conceituais. É um campo fértil analisar a sua obra literária desde os seus poemas, passando pela crítica cinematográfica, até a sua escrita em forma de diário. Quando a palavra se insere na sua obra cinematográfica, é igualmente interessante refletir sobre como ela assume protagonismo dentro do processo de construção imagética que o realizador efetua nos seus filmes-diário.
No entanto, o objetivo deste trabalho é assumir um recorte mais conceitual, sobre como o uso da palavra na obra de Jonas Mekas termina estabelecendo vínculos entre trabalhos tão distintos dentro da sua trajetória literária e cinematográfica. É o caso do diário de exílio que Mekas escreveu entre 1944-1945 dentro de um contexto de Segunda Guerra Mundial; o filme "The brig" (1964), registro documental feito por Mekas sobre uma peça com o mesmo nome, escrita por Kenneth Brown e apresentada em 1963 pelo The Living Theater; o filme-diário "As I Was Moving Ahead Occasionally I Saw Brief Glimpses of Beauty" (2000). Estes três trabalhos possuem como ponto em comum a questão do confinamento. Mekas começou a escrever o seu diário de exílio a partir do momento em que teve que fugir da sua terra natal (Lituania), até ser preso pelos nazistas e ficar confinado nos campos de concentração. É no confinamento também que se constrói "The Brig", onde o filme relata, através da peça de teatro, a rotina de uma prisão militar da marinha norte-americana e as condições de submissão e trabalhos forçados pelo qual soldados foram condenados. Já sem o contexto de uma prisão, mas ainda assim confinado na sua casa e diante dos seus registros fílmicos, Mekas aguarda a virada do século rememorando sobre a moviola momentos da sua vida, no filme-diário "As I Was Moving Ahead...". É a partir destas diferentes formas de confinamento que a questão da palavra assume protagonismo na construção destas obras. É diante deste confinamento que a palavra o liberta. Se Mekas necessitou realizar trabalhos forçados enquanto esteve preso nos campos de concentração, foi na escrita do seu diário que ele encontrou uma forma de libertar-se da sua condição de prisioneiro. “Vocês criaram esta civilização, estas fronteiras e estas guerras, eu não posso nem quero entendê-los... Sou livre inclusive nas suas guerras” (MEKAS, 2008, p.50). Em "The Brig", no texto original representado pelos atores, a palavra é domesticada, desumanizada, os prisioneiros repetem exaustivamente as palavras de ordem dos seus comandantes. Assim como o filme ressalta a mecanização dos sentidos nos prisioneiros, a palavra também se torna uma construção de poder que padroniza os seus comportamentos. É justamente neste confinamento da palavra que The Brig assume não somente um caráter de denúncia, como também propõe uma nova forma para refletir sobre o uso da palavra. Áspera e objetiva, a palavra incomoda, intima uma reflexão sobre a própria imagem e a representação cinematográfica. Em "As I Was Moving Ahead...", confinado na sua casa, diante da sua moviola e materiais de arquivo, Mekas intima o espectador a participar do processo de construção do próprio filme, procurando torná-lo seu próprio confidente. “Meus queridos espectadores, chegamos a capítulo 4. Me perdoem: nada, nada extraordinário até agora aconteceu neste filme”, afirma Mekas, com o uso da voz em off. A palavra o liberta do seu isolamento, convoca a uma interação imaginária de Mekas com o espectador. É diante da ideia de confinamento que Mekas estabelece distintas relações com a palavra, construindo formas de significação que confrontam tanto a um contexto histórico, como também ao próprio campo simbólico das imagens. Na sua obra, a palavra assume um protagonismo que a impede de ser uma mera reprodução ou complementação do que pode ser mostrado em imagens. Confinada, a palavra constrói novos sentidos que a libertam do seu próprio confinamento. |
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Bibliografia | COMOLLI, Jean Louis (2007), “Prisiones de la mirada”. em Jean Louis Comolli. Ver y poder – La inocencia perdida: cine televisión, ficción, documental, Aurelia Rivera, Buenos Aires.
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