ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | A poética de Waly Salomão em Pan-cinema permanente |
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Autor | João Paulo Rabelo de Farias |
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Resumo Expandido | O cinema documental brasileiro recente, como apontam alguns pesquisadores, vem mostrando uma inclinação para a particularização do enfoque que encontra nos filmes com traços biográficos um lugar para se desenvolver e, em algumas produções, pensar o próprio fazer cinematográfico, conforme aponta Mesquita (2010). O gênero biográfico, bastante conhecido e trabalhado na literatura e nos meios audiovisuais, aparece em certos filmes contemporâneos potencializado por uma dimensão criativa que não se reduz apenas às rememorações ou narrativas. Nesse cenário, destaca-se Pan-cinema permanente (Carlos Nader, 2008), documentário sobre o poeta baiano Waly Salomão que vibra intensamente sua poesia e, que por suas operações formais, coloca questões sobre o cinema e suas mediações. Interessada em se estabelecer na fronteira das linguagens, a obra de Waly Salomão e, em certa medida, sua personalidade inspiraram o trabalho de Carlos Nader, diretor e amigo, que o acompanhou ao longo de 15 anos em viagens, ocasiões solenes, visitas descontraídas e reuniu também vasto material de arquivo para articular na tela, com o mesmo caráter movediço e fronteiriço, os elementos característicos da poética do autor. Sem maneirismos, “cada trecho guarda a força de um fragmento poético, de um gesto ‘alterante’ e performático” (MESQUITA, 2010). Desse modo, Pan-cinema ao se lançar no trabalho de abordar um personagem tão rico na performance de sua vida, na literatura que produziu e nas lembranças que deixou, parece irradiar-se com o brilho do poeta, isto é, incorporá-lo por meio de alguns motivos de sua poesia caleidoscópica e intensa. Emergindo nessa obra como por meio de “tubos alquímicos”, os motivos poéticos do retratado são bons indicadores de leitura desse trabalho de Nader. Por motivos poéticos, entendemos aquilo que constitui, na obra de Waly Salomão, uma indagação recorrente, criadora. Mais do que temas, esses motivos são como uma "procura viva" que (re)alimenta a obra de Salomão, são como norteadores que estão sempre-já instalados em sua poética. Buscando identificar os pontos de contato, as passagens do filme em que há um tangenciamento – ora nuançado, ora marcante – entre esses motivos poéticos e os episódios que são desdobrados nas imagens, as leituras sugestionadas e a forma como eles retornam no quadro geral, estabelecemos três motivos para investigação: máscara, teatro e fronteira. Lembrando que esses motivos, por fazerem parte de uma obra tão polimórfica, muitas vezes se cruzam, se interpenetram como numa algaravia. A noção de máscara na obra poética de Waly Salomão é proeminente, com referências literais, mas também se coloca como um motivo que estrutura o pensamento do poeta, quando ele reflete sobre vir a ser outros. Ciente de que o personagem sobrepunha máscaras sobre máscaras, o documentário multiplica os mascaramentos com sobreposição de grafismos nas imagens, registros que ao invés de mostrar plenamente, deixam entrever, telas de TV dentro da tela do filme e interposições de telas sobre outras telas (como máscaras para as imagens) etc. Já em torno do caráter teatral de Waly Salomão o filme traz diversos registros em que o poeta "não se adequa à vida como ela é", ou seja, cria, fabula nas situações e, segundo sua própria medida, pratica poesia no cotidiano. Além disso, certos expedientes do mundo teatral e cinematográfico vêm para o plano sonoro e visual, seja em efeitos de pós-produção, e em arquivos, seja em captações in loco, ou ainda em falas do retratado e amigos. Por fim, o motivo da fronteira foi um norteador forte em suas buscas poéticas. Essa indagação criativa é recorrente até quando se observa, em certa medida, a sua personalidade – fronteiriça – como ele descreve em um trecho do documentário. Nessa chave, o filme visita fronteiras, tensiona limiares como os de lugares geográficos que se alternam em idas e vindas na montagem ou situações mais elétricas e performáticas que se avizinham de calmarias e conversas prosaicas. |
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Bibliografia | CESAR, Ana Cristina Cruz. Literatura não é documento. Rio de Janeiro, FUNARTE, 1980. |