ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | A fuga como um caminho |
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Autor | Virgínia Paula Pinho Freitas |
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Resumo Expandido | Em “A saída dos operários da fábrica” (Arbeiter verlassen die Fabrik, Alemanha, 1995), Harun Farocki toma como ponto de partida a película “A saída dos operários da fábrica Lumière” (La Sortie des usines Lumière, França, 1895), dos irmãos Louis e Auguste Lumière. Considerado como um marco na história do cinema, o filme dos Irmãos Lumière dura aproximadamente 45 segundos e mostra frontalmente cerca de 100 operários saindo da fábrica de artigos fotográficos de Lyon-Montplaisir. Durante 12 meses Farocki se debruçou sobre uma vasta produção imagens realizadas em diversos períodos e suportes e para diversas finalidades que registravam variações possíveis para esse tema: a saída da fábrica. Com esse material fez um filme. A saída da fábrica destaca a contradição entre a fuga para a liberdade do não-trabalho, do ócio, da vida lá fora, ao mesmo tempo em que expõe uma coreografia do controle. Uma coreografia que se revela mais sutil e opaca, por isso mesmo mais eficiente. Neste sentido, Farocki vai ao encontro da perspectiva de Ranciére, na qual “se existe uma conexão entre arte e política, ela deve ser colocada em termos de dissenso – o âmago do regime estético” (RANCIÈRE, 2010). Lepecki também enfatiza esse ponto de vista ao caracterizar esse âmago como algo que “é em si mesmo dinâmico, cinético, no sentido de que dissenso produz a ruptura de hábitos e comportamentos, e provoca assim o debandar de toda sorte de clichês: sensoriais, de desejo, valor, comportamento, clichês que empobrecem a vida e seus afetos.” (LEPECKI, 2012.) A base material do trabalho fabril recobriu o fenômeno do trabalho alienado com uma “capa” de invisibilidade difícil de ser devassada pelas imagens. Restou pouco para o cinema. Talvez um reduzido território fronteiriço. Quase uma linha traçada no chão, que faz da “saída dos operários”, paradoxalmente, um “retorno” necessário. Ali, para além da imagem-clichê do sistema de máquinas e dos movimentos repetitivos da grande indústria, encontra-se um limiar, uma condição de movimento, um espaço de contingência e mutação, de passagem. Um limiar que se faz através de uma tensa coreografia de controle dos corpos. Uma coreografia também de obscuridade, com pontos cegos, opacidade. Fronteira entre essência e aparência, entre a esfera da produção e da circulação de mercadorias. Lembrando que nessas circunstâncias históricas, o trabalho fabril é fundamentalmente trabalho alienado (Marx, 2004). A negação que Farocki faz se dá através de um estranhamento brechtiano, onde fica evidente o despedaçamento da lei da circulação de mercadorias. O estranhamento é produzido na imagem estática do coro. Tudo está parado. O movimento cessa. Uma coreografia sem movimento. O direito de propriedade que está lastreado na lógica da circulação de mercadoria não dá conta do conflito, é, na verdade, a causa do conflito. O “Não” da ordem se segue ao “Não” dos trabahadores. Surge o dissenso no filme. A greve aparece como anti-movimento da circulação sistêmica. A coreopolítica proposta por Lepecki vai além do espaço do saída da fábrica, que é o foco de Farocki, seu palco é toda a cidade. Contudo, a perspectiva e o modo operante são profundamente interligados. Há aqui uma apropriação dos conceitos de Ranciére e Lepecki com objetivos próprios na compreensão do filme “Saída dos operários da fábrica”. A porta da fábrica é um espaço de coreografia específica dos trabalhadores, espaço de fronteira, de devir, de ruptura onde explodem contingência e liberdade. Lugar de transição, apesar de ser o espaço de controle por excelência. Por outro lado, essa liberdade sublimada recai elipticamente numa constante dessublimação repressiva, suave, total. O movimento não realiza a liberdade. O movimento permanece repetido, como movimento da mercadoria que vai reproduzir seu valor para retornar no dia seguinte ao processo de produção e circulação. Consumir como indivíduos para serem consumidos enquanto classe no espaço oculto da produção. |
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Bibliografia | ADORNO, Theodor e HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento – Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1985. |