ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | A presença do figurante como estremecimento da imagem no Cinema Novo |
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Autor | Pedro Figueiredo Veras |
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Resumo Expandido | O Cinema Novo brasileiro é tema de incontáveis pesquisas acadêmicas. Inspirados pelas experiências neorrealistas que deslocaram as câmeras para as ruas, os cinemanovistas se lançaram nos espaços precários e de extrema pobreza do Brasil no intuito de compreenderem a realidade do país. Dessa forma, nas telas não aparecem apenas os corpos, gestos e vozes de atores e atrizes profissionais, protagonistas, regidos por roteiros pré-elaborados e uma mise-en-scène bem orquestrada. Eles compartilham o espaço fílmico com outras figuras significativas para a compreensão do caráter político buscado pelos realizadores: os figurantes. Como exemplos, podemos elencar algumas sequências marcantes: as de "Bahia de todos os santos" (Trigueirinho Neto, 1961) com rodas de capoeira e de samba; a sequência em "Porto das caixas" (Paulo César Saraceni, 1962) em que a personagem de Irma Alvarez vai à feira e a câmera passeia pelos rostos, fisionomias e gestos da população local de Itaboraí; ou ainda as pregações de Sebastião (Lídio Silva) em "Deus e o diabo na terra do sol" (Glauber Rocha, 1964), em que vemos figurantes que o observam atentos, enquanto alguns outros interagem com a câmera de forma singular. Tendo essas imagens em vista, indagamos: como são apresentados, na materialidade fílmica, os figurantes desse cinema que esteve tão engajado nas questões sócio-políticas de seu tempo? Que espaço lhes é concedido em cada enquadramento e como se põem em cena as suas experiências históricas? Por meio de uma longa análise sobre os figurantes na história da arte, em "Peuples exposés, peuples figurants" (2012), o filósofo Georges Didi-Huberman, entende que eles estão na constante espera por serem reconhecidos e nomeados. São “sem-nome”. Enfrentam um paradoxo por terem rostos, corpos e gestos próprios, que no entanto são negados por uma mise-en-scène que os quer estereotipados, compondo uma multidão. Nesse sentido, o autor lança uma exigência político-estética: como as artes das imagens podem expor esses “sem-nome” a si próprios e não ao seu desaparecimento? Como fazer com que suas singularidades se sobressaiam e deixem a ver “parcelas de humanidade”? O presente trabalho pretende percorrer algumas obras-chave da fase inicial do Cinema Novo, sob uma ótica voltada para os figurantes, propondo uma reflexão a respeito do potencial crítico das imagens construídas por alguns desses filmes. As aparições de seus corpos, seus gestos, seus olhares seriam capazes de dar a ver suas singularidades, suas “parcelas de humanidade”? A ideia é restringir o arco temporal dos filmes analisados ao período entre os anos de 1958 e 1966, demarcado por "Brasil em tempo de cinema" (2007) de Jean-Claude Bernardet, quando observa-se uma forte pregnância das influências neorrealistas na estética do Cinema Novo (as câmeras nas ruas filmando o povo em sua condição real, planos longos, fotografia em preto e branco, escassez de recursos). Além dos filmes já citados, propomos examinar "Rio, zona norte" (Nelson Pereira dos Santos, 1958), "A grande feira" (Roberto Pires, 1962), "Os fuzis" (Ruy Guerra, 1964) e "O padre e a moça" (Joaquim Pedro de Andrade, 1965). O corpus é extenso, mas vale frisar que a análise irá se deter sobre as imagens dos figurantes, que são elaboradas segundo lógicas muito diversas em cada filme, procurando estabelecer relações, diálogos e dissonâncias entre as obras, numa perspectiva comparada, a fim de explorar a complexidade estética e política do Cinema Novo. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. Du visage au cinéma. Paris: Editions de l’Etoile / Cahiers du cinéma, 1992. |