ISBN: 978-85-63552-21-1
Título | Documentário radical ou a ficção como colaboração: da crise ao engajam |
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Autor | Philipi Emmanuel Lustosa Bandeira |
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Resumo Expandido | Visto numa clivagem histórica entre pioneiros e contemporâneos, o atual documentário brasileiro pode ser considerado uma experiência que radicaliza a formulação clássica de “tratamento criativo da realidade”, justamente pelos artifícios ficcionais e/ou funções fabuladoras lançadas em linguagens híbridas e modos colaborativos de produção. Filmes como As Hipermulheres (2011), A cidade é uma só? (2012) e A vizinhança do Tigre (2013), se por um lado configuram-se a partir da performação de realidades sociais periféricas ou mesmo de outras alteridades, como a cosmologia ameríndia, por outro só são possíveis porque firmam-se em engajamentos de base comunitária, que sustentam o paradigma do processo criativo e de representação fílmica. Nesse sentido, compreender a relação estética-política em sua indissociabilidade constitutiva, bem como a invenção ficcional não estereotipada do documentário (Rancière 2005) ou a “obrigação de criar”, neste, “as narrativas não escritas, as ficções não esgotadas”, no dizer do Comolli (2010), parece-me ser crucial para uma debate sobre estas obras. A função fabuladora seria, ainda, ao contrário de uma suposição primária ou cartesiana que julga tal artifício como oposto à verdade factual, precisamente o exercício que lança as personagens à uma realidade de fato, preenchendo-as de presente entre temporalidades de passado e futuro, opondo-se à ficção e à verdade “dominantes”, no que Deleuze chamou de “as potencias do falso” (1990). O objetivo de recuperar uma historiografia do documentário em seus pioneiros para trazer ao debate sobre os contemporâneos brasileiros é, inicialmente, desfazer a falsa divisão entre “gênero” documentário e “vanguardas modernistas”, pontuando que estas vertentes não apenas possuem uma inter-relação de origem, mas que transformaram-se mutuamente. Apesar da repressão dos normatizadores clássicos, que tentaram banir a abordagem social e a estética fragmentada do modernismo na reconfiguração de discursos “oficiais” de aparelhamento ideológico do estado, contudo, o documentário desenvolveu-se como um largo campo em disputa, entre a afirmação e a crítica do poder instituído, reaparecendo aqui e ali as características engajadas e de experimentalismo formal. Interligando a linhagem tradicional do documentário à vertente contemporânea brasileira, volto a Grierson para chamar a atenção que, em seu manifesto, o quê ele opõe veementemente ao documentário é o artifício da encenação de estúdio, e não a dramatização em si: afinal, a configuração de seu gênero no modelo “etno-melodramático” de Robert Flaherty seu melhor exemplo. Paul Rotha, parceiro e compatriota de Grierson, reitera essa posição ao afirmar categoricamente que “a essência do documentário é a dramatização do material real” (apud Jacobs 1979). Portanto, a julgar por esta tradição griersoniana, os filmes contemporâneos recortados no corpus podem ser considerados, à despeito de suas cargas ficcionais – ou justamente por estas – como radicalmente documentários. Ou como documentários radicais. Isto porque no cenário contemporâneo o documentário brasileiro parece radicalizar o gesto de dar tratamento criativo à realidade, ao utilizar-se livremente da ficção, partir para a experiência da fabulação ou investir diretamente nos “dispositivos”, derivando para as bordas e flertando com fronteiras. Em certas obras, entretanto, a própria fricção a um ponto indiscernível entre real e fabulação é uma artifício de tensão não só dramática, mas política, que carrega um lugar de fala. Estética e política. Cinema híbrido e cinema expandido. O cinema político ou a política do cinema? A reflexão encontra referência sobretudo em filmes brasileiros recentes, em que a escrita fílmica é firmada e assinada com a comunidade e suas pautas – parte delas e delas faz parte, na verdade. O filme, enquanto projeto, não implementa uma agenda externa; tampouco o paradigma é comercial, mas orientado por uma política cultural coletiva e autônoma das comunidades. |
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Bibliografia | ALLRED, Jeff. American modernism and depression documentary. Nova Iorque: Oxford University Press, 2010. |