ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | A (DES)CONSTRUÇÃO TÉORICA DO GESTO NO DOCUMENTÁRIO DE EVALDO MOCARZEL |
|
Autor | Cristiane do Rocio Wosniak |
|
Resumo Expandido | Nesta investigação pretendo evidenciar o sistema teórico do documentarista brasileiro Evaldo Mocarzel na construção de um pensamento que alicerça a sua práxis cinematográfica e vice-versa. A reflexão se debruça sobre entrevistas, ensaios, a Carta de Montagem enviada ao cineasta Marcelo Moraes (15/10/2008) e sobre o ato cinematográfico daí resultante, o documentário Canteiro de Obras: São Paulo Companhia de Dança (2010). A sistematização de um possível pensamento mocarzeliano calcado no conceito de desconstrução gestual, será cotejada pela verificação do uso reiterado dos procedimentos cinematográficos de falso raccord, da montagem-cut, dos cortes ancorados pela fração de movimento e que, segundo Mocarzel, vão “construir uma miríade de gestos [...] um experimento cinematográfico-coreográfico” (MOCARZEL, 2008, p. 5). A Carta de Montagem escrita em tons poéticos, faz uma ode à dança, evidenciando a paixão do cineasta por essa forma de arte e o ensejo recorrente de realizar um “casamento artístico do cinema com a dança” (MOCARZEL, 2016, p. 33) tendo por mediação o movimento. Ao declarar que tanto a dança como o cinema podem prescindir de palavras, exerce esse credo na condução de seu documentário que, em nenhum momento, se utilizará de entrevistas ou depoimentos verbais dos atores sociais que performam sua dança por meio de gestos r(a)presentados e estilhaçados em diferentes locações reverberando um pensamento documental explícito: “documentário pra mim é uma ficção de representação do real... Você vai ali cortar o mundo e reorganizar no processo de montagem....” (MOCARZEL, 2011). Esse pensar-fazer cinema reveste-se, portanto, de um raciocínio icônico cinético. Observa-se em Mocarzel um pensamento ancorado nas premissas de André Bazin (2014) no que se refere à questão da presença do corpo em(na) cena. Mocarzel em seu ensaio intitulado Cinema e dança: diálogos linguísticos em casamentos artísticos marcados pelo movimento (2016), refere-se ao argumento de Bazin para o qual o olhar da câmera cinematográfica cria proximidades e efeitos possíveis de presença a partir de processos como fragmentação e decupagem “potencializando os vestígios da presença captada nos planos” (MOCARZEL, 2016, p. 35). Em uma entrevista na TV, Mocarzel comenta sobre o processo de fragmentação cinematográfica como potência de uma (re)criação de uma presença icônica: “cinema é uma linguagem fragmentária. Você tem que recortar mesmo para tirar proveito nesta reorganização de vida e criar uma verdade documental” (MOCARZEL, 2011). A verdade documental neste ‘filme que dança’ aposta na miríade de movimentos em falsos raccords obsessivos e no desnudamento do corpo como um mosaico de imagens formado a partir de multiperspectivas do olhar da câmera. Em uma entrevista concedida à autora, e posteriormente transcrita, o cineasta menciona o pensamento/método que povoa de forma recorrente a sua composição cinematográfica: a ‘Arquitetura do Inesperado’. Mocarzel (2017, p. 2) afirma: “além de todo o processo, da produção à montagem, da pesquisa à mixagem, estou sempre esperto para uma possível irrupção do inesperado, ou melhor, eu sempre abro espaço para o inesperado na composição do filme.” A filmagem de corpos dançantes sob variados pontos de vista (traquitanas acopladas aos corpos dos bailarinos) exerce uma função significativa nos documentários deste cineasta, cuja ubiquidade da câmera, amplia o conceito da alteridade, com o qual mescla a sua linguagem. Mocarzel parece se nutrir da organicidade e da re(a)presentação do outro em seus filmes, ao afirmar: “fazer filmes, sobretudo documentários, é um diálogo permanente como o outro, em atrito permanente com minhas próprias obsessões linguísticas” (MOCARZEL, 2017, p. 2). Nesta investigação, excertos do filme serão analisados como balizamentos deste ‘arco narrativo mocarzeliano’ em que a linguagem, o conceito e a brecha para o inesperado se (re)tecem constantemente em busca de um pensar-fazer autoral. |
|
Bibliografia | BAZIN, André. O que é o cinema? São Paulo: Cosac Naif, 2014. |