ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | Escritas do Silêncio em El Sol del Membrillo (Víctor Erice, 1992) |
|
Autor | RAFAEL TASSI TEIXEIRA |
|
Resumo Expandido | El Sol del Membrillo (Víctor Erice, 1992) é um filme imenso na estruturação dos processos de intensidade com que o tempo se revela uma força centrífuga, canibalizando a imagem, irrompendo em seu interior silencioso, devolvendo-a para a intranquilidade da memória – soterrando-a sob a confinação do fotograma que, por outro lado, a cada olhar de espectador, também redefine e o libera. Nesse sentido, o filme é fundamental na construção da história recente do documentário biográfico na Espanha, porque funde metáfora e metamorfose, imaginação e imagem, subjetividade e distanciamento, diacronia e sonho, arqueologia do passado e presentificação do futuro (COMOLLI, 2014). Embora um filme do início da década de 1990, El Sol del Membrillo sustenta um dos primeiros movimentos que transformam a linguagem cinematográfica e a indissociabilidade ficção-realidade-ensaio documental (registro, processo e jogo fílmico) em uma proposta que aborda os movimentos do documentário como processos de perfuração, ou seja, a câmara vai ao pintor, o pintor invade a imagem para revelar aquilo que ambos (corpo e câmera) provavelmente não tem como reter: o inacabamento da superfície da imagem que a temporalidade deteriora, constante, inadmissível, silente, criadora. Revelando os movimentos do pintor em uma espécie de tentativa de captura (a inscrição da marca, a fome do registro) da destruição imortalizante da árvore que, condenada a derrubar seus frutos, morre cada dia, El Sol del Membrillo lembra da relação corpo-cenário-máquina, como escreve Comolli (2006), através daquilo que é indestrutível – o tempo que a luz interfere no plano, a força com que o movimento cronológico cria um index de uma situação da realidade: o pintor, condenado ao fracasso da impossibilidade da captura, desiste de antemão de convidar a imagem a interromper sua vontade predatória, mas, ainda assim, perdura e participa em sua reversibilidade. Nesse sentido, o filme estabelece uma linha divisória na história recente dos documentários na Espanha. Questiona a funcionalidade das imagens em relação ao processo de constituição cinematográfico que trará, sobretudo, a experiência e a expectativa da metamorfose. El Sol del Membrillo pode ser visto como um avanço significativo na problemática da dimensão visível\invisível do enfrentamento com uma realidade tensionada muito além da questão ‘ficcional’, ‘narrativa’, ‘metafórica’ e sua anteposição ao campo documentário. Produz um movimento – longe de ser retilíneo – de permanente jogo de relações com as marcas (a própria marca do pintor sobre o fruto da árvore) e a insistência com que a árvore constantemente se transforma. Não obstante, há um dialogismo sobre a história da observação, sobre o ato contínuo de espera, por parte do pintor e do cineasta, sobre o processo de reconhecimento da própria perda da imagem, ou, ao menos, daquilo que ela antepõe e poderia tentativamente revelar (esconder\tapar\confundir mais). El Sol del Membrillo não é apenas um cinema com força de demolição dos paradigmas do documentário e sua relação com um indecifrável ato de querer observar (o que está irremediavelmente sempre um passo adiante do observável). Atesta a própria essência cinematográfica como uma essência em contaminação. |
|
Bibliografia | AROCENA, Carmen. Víctor Erice. Madrid: Cátedra, 1996. |