ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | O anatomista especulativo: Filme, Frampton, Frye |
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Autor | Lucas Bastos Guimarães Baptista |
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Resumo Expandido | Num caso representativo da atuação dos cineastas de vanguarda, Hollis Frampton atravessou constantemente suas reflexões estéticas com apontamentos sobre filmes que desejava realizar. A teorização, para ele como para tantos outros, foi um meio de manter o pensamento ativo: por um lado, suas obras serviam como objetos concretos aos quais se poderia referir e com isso demonstrar um preceito; por outro lado, modelos hipotéticos sugeriam, aperfeiçoavam e conduziam trabalhos subsequentes. Artista de inclinação modernista, Frampton tomou como uma das bases de sua carreira a fertilização cruzada entre a teoria e a prática. Foram de seu interesse, portanto, não apenas as condições nas quais as obras ganhavam existência, mas também as coordenadas do campo imaginativo no qual elas reverberavam. Em determinado momento, Frampton comenta um problema no desenvolvimento das teorias cinematográficas: a tendência a desenvolver um quadro conceitual que precede as obras e que estabelece suas posições de acordo com o uso social ou com critérios derivados de outras disciplinas. O argumento de Northrop Frye sobre a literatura aborda o mesmo problema. Contrariando essa tendência, Frye defende que a teoria deve surgir de um exame indutivo do próprio campo da arte, e que é das obras, e da maneira como elas são criadas, que devem ser retirados os princípios com os quais o trabalho conceitual será realizado. A convergência entre eles ocorre no que Frampton chamou de “uma morfologia que veja o cinema não por fora, como um produto a ser consumido, mas por dentro, como um código orgânico em evolução” (JENKINS, 2009). Por essa ótica, a teoria, ou o pensamento sobre uma arte, deve ter sua própria autonomia. A visão da arte como um campo a ser investigado, e principalmente, como um quadro de possibilidades formais, é central para ambos os autores. Tanto Frampton como Frye, em seus contextos particulares, demonstraram evidente interesse pelo aspecto científico da teoria, a noção de que a pesquisa necessita de uma separação rigorosa entre os aspectos inevitáveis e os contingentes, entre os fenômenos observáveis e as descrições especulativas. O estudo da arte, como numa disciplina científica, deve supor aqui uma espécie de coerência interna; a arte não deve ser considerada como um acúmulo arbitrário de obras e opiniões numa área cultural comum, mas como uma “ordem de formas”. As diferentes preferências críticas, segundo Frye, não devem conduzir as investigações, mas serem integradas como partes do mesmo edifício. No caso de Frampton, a concepção modernista faz com que ele parta do “material fílmico” e da “máquina total do cinema” como uma estratégia de circunscrição dos interesses. As perguntas a serem feitas tornam-se então relativas às propriedades da “arte do filme”, e às suas possíveis articulações. Dessa circunscrição seriam derivados os “axiomas da composição”, e os gêneros e as convenções seriam encarados como ramificações do material fílmico. A atividade crítica, por sua vez, torna-se a descrição anatômica deste campo. Há também uma consequência “centrífuga” da teoria artística segundo os dois autores. Para Frye, a literatura, a “arte das palavras”, informa outras disciplinas verbais, como a história e a filosofia, que dela retiram procedimentos, imagens ou mesmo estruturas narrativas. Por essa perspectiva, estudar as variedades da capacidade literária é como investigar o alcance de uma ferramenta, e desenvolver com isso uma faculdade imaginativa. Da mesma forma, é sugerido por Frampton que o cinema ocupa uma posição privilegiada entre as tecnologias de comunicação: um cruzamento entre a pintura, a fotografia, a televisão e o vídeo. O cinema, neste cenário, é parte de um encadeamento que define “uma contraparte da linguagem”, a possibilidade de um meio “mais compacto e mais universal que a linguagem verbal”. Estudar o cinema, a arte das imagens e sons, seria assim equivalente a explorar uma região da imaginação. |
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Bibliografia | FRYE, Northrop. Anatomia da Crítica. São Paulo: É Realizações, 2014. |