ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | As formas da vida (em) comum em A viznhança do tigre |
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Autor | César Geraldo Guimarães |
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Resumo Expandido | Este trabalho procura analisar os principais componentes da escritura fílmica de A vizinhança do tigre (Afonso Uchoa, 2014), que se vale da combinação e também da indiscernibilidade entre os registros ficcionais e documentais pelos quais transitam seus personagens. O filme é animado por um duplo movimento: ao mesmo tempo em que, em sua matéria sensível, busca se impregnar pelas formas de vida das juventudes periféricas – abrindo-se à duração do cotidiano, aos modos de habitar o espaço e à intensidade dos laços afetivos – também lança mão de recursos ficcionais que redimensionam certos aspectos da experiência dos sujeitos filmados, na qual se alicerça sua construção narrativa. Como afirma Jean-Louis Comolli, quando a pessoa real é filmada, ela se divide em dois e “flutua em torno de seu devir fílmico” (2012, p. 422). Quais são então as operações e procedimentos expressivos que, neste filme, promovem a passagem das pessoas reais para o âmbito de uma ficção que não encobre o que de real se inscreve no corpo dos atores quando atuam em seus papéis? Tendo como protagonistas jovens da periferia da cidade de Contagem (MG), o filme os acompanha em suas andanças e encontros na vida cotidiana do bairro Nacional, e visita – de maneira cúmplice – os universos do trabalho, da música (o rap e o heavy metal), da amizade e das brincadeiras, das drogas e do crime (com sua violência real e seu apelo imaginário). Se, como afirma Jean-Louis Deotte (2007, p. 12), em debate com Jacques Rancière, no âmbito das imagens técnicas toda aparição do sensível passa pela configuração do que ele chama de “aparelho”, queremos compreender como se dá a composição peculiar da cena cinematográfica em A vizinhança do tigre, detendo-nos especialmente nas escolhas que guiam a presença dos corpos e dos rostos no quadro, bem como as formas de conversação entre os personagens acionadas pelo filme. A mise en scène que ampara a visibilidade alcançada pelos sujeitos filmados e a riqueza sensível que eles retiram dos mundos que habitam são sempre peculiares, pois resultantes da combinação contingente de elementos variáveis. Afinal, como reivindica Didi-Huberman, o regime da imagem não é nem um reino nem um horizonte, mas um “regime empírico de abordagem e de aproximações locais” (2011, p. 87). Tendo isso em mente, nosso propósito é o de compreender como a mise en scène de A vizinhança do tigre rompe com o sensorium da dominação e reparte de outro modo a partilha do sensível até então estabelecido (nos termos de Rancière), dando a ver o território da vida em comum tanto em suas fraturas internas, quanto nos liames que os sujeitos inventam entre si. |
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Bibliografia | DÉOTTE, Jean-Louis. Qu’est-ce qu’un appareil? Benjamin, Lyotard, Rancière. Paris: L’Harmattan, 2007. |