ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | A performance da violência no documentário |
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Autor | Gabriela Machado Ramos de Almeida |
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Resumo Expandido | Este trabalho dá continuidade à proposta de investigação de alguns dos modos através dos quais o cinema não-ficcional dá a ver a violência. Da pesquisa levada à SOCINE em 2016 sobre uma iconografia do sofrimento presente na obra do pintor espanhol Francisco de Goya e retomada por Jean-Luc Godard na série “História(s) do cinema”, passa-se agora ao interesse pelo estudo da performance da violência no documentário, especialmente na produção contemporânea que se debruça sobre a violência do Estado. Parte-se de um mapeamento inicial de filmes tão díspares em origem e proposta estética e narrativa quanto “S-21, la machine de mort Khmère rouge ” e Duch, le maître des forges de l'enfer” (ambos de Rithy Pahn, 2002 e 2012), “O ato de matar” e “The look of silence” (Joshua Oppenheimer, 2012 e 2014), “Orestes” (Rodrigo Siqueira, 2015) e “A noite escura da alma” (Henrique Dantas, 2015), para tentar compreender como é performatizada a violência em documentários que se valem de métodos como reencenação da tortura, entrevistas com agentes da repressão e ativação de materiais de arquivo como dispositivo de confronto (sejam imagens ou documentos). A proposta que se esboça não é de apresentar análises dos filmes mencionados, mas antes de testar uma aproximação a este tipo de produção partindo do pressuposto de que está colocada pelas obras uma dimensão de performance, compreendida, a partir de Diana Taylor, como “um processo, uma práxis, uma episteme, um modo de transmissão, uma realização e um meio de intervir no mundo [...]” (TAYLOR, 2013a, p. 16); prática incorporada, ato de transferência vital, comportamento expressivo que transmite memória e identidade cultural e que “faz reivindicações políticas e manifesta o senso de identidade de um grupo” (TAYLOR, 2013b, p. 19). Se, como afirma Taylor em um debate sobre a polissemia do termo performance e seu uso por diferentes áreas do conhecimento, a ideia de performance é atravessada por noções como teatralidade, espetáculo, ação e representação (2013a, p. 14), nos parece desafiador pensar como parte da produção documental vem tentando construir formas de figuração da violência que transbordam a discussão mais comum a respeito da representação, dos limites entre ética e estética e da assunção de procedimentos ficcionais pelo documentário, nos convidando a exercitar outros olhares. Ao mesmo tempo em que estas questões são todas caras aos filmes mapeados até o momento – inevitável pensar a respeito do que está em jogo quando um documentarista decide escutar um carrasco ou reencenar a tortura, por exemplo - o modo como elas são resolvidas nas obras coloca desafios especulativos, nos interpela e convoca à reflexão sobre o cinema como meio que “oferece oportunidades únicas de explorar tanto os procedimentos operacionais da violência quanto a retórica e a imaginação que a produzem [...], como ferramenta para articular histórias de violência política e ao mesmo tempo de analisar como o próprio cinema opera como um agente destas histórias” (BRINK & OPPENHEIMER, 2012, p. 3). A noção de performance, tão associada à artificialidade e aparentemente construída em oposição ao “real”, pode fornecer algumas pistas para pensar sobre o tipo de memória que estes documentários buscam construir não quando operam no nível do testemunho ou da evidência – apesar dos resgates histórico que fazem - mas especialmente quando os seus métodos tentam revelar no presente as implicações do passado. |
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Bibliografia | BRINK, Joram Tem, OPPENHEIMER, Joshua (orgs.). Killer images: Documentary Film, Memory and the Performance of Violence. New York: Columbia University Press, 2012. |