ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | O silêncio do ruído |
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Autor | Andreson Silva de Carvalho |
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Resumo Expandido | Há muito o que se falar da relação existente entre silêncio e ruído. Por isso, não se pretende aqui apresentar para todas essas possibilidades, nem mesmo dar conta de resolver alguma das suas questões. O objetivo deste artigo é apontar mais um dos possíveis caminhos presentes na análise deste tema e alimentar discussões pertinentes. Muito se fala sobre os ruídos existentes no silêncio; da não existência de uma ausência sonora real; da experiência realizada por John Cage no interior de uma câmera anecoica, mas, e o silêncio do ruído? “Há tantos ou mais silêncios quantos sons no som” (WISNIK, 1989: 18). Todas as ondas sonoras são compostas por uma sucessão infinita e muito rápida de sinais sonoros e silêncios, pois, se assim não fosse, nossos tímpanos não suportariam a pressão produzida pelos sons que chegam aos nossos ouvidos. “A única proteção para os ouvidos é um elaborado mecanismo psicológico que filtra os sons indesejáveis, para se concentrar no que é desejável. Os olhos apontam para fora; os ouvidos, para dentro” (SCHAFER, 2001: 29). São muitas as sonoridades que nos atravessam a todo instante, porém, nosso aparelho auditivo, diferentemente dos microfones, consegue distinguir os sons que fornecem alguma informação nova e necessária à nossa percepção, suscitando uma ação ou reação ao som emitido. Caso contrário, quando não há nada a despertar nosso interesse auditivo, pode-se até mesmo produzir-se, momentaneamente, a falsa impressão de ausência sonora. Muitas foram as críticas recebidas por R. Murray Schafer quando, no seu estudo sobre paisagens sonoras, apontou para a necessidade de uma despoluição auditiva. Escolher quais sons eram bons o suficiente para permanecerem sendo reproduzidos e fazendo parte de nossas percepções, parecia o mesmo que definir qual o ritmo musical todos deveriam gostar e ouvir para o resto de suas vidas. Um som, que na percepção de uns pode ser agradável, para outros pode ser extremamente irritante e desconfortável. A sonorização audiovisual trabalha justamente com a construção destas percepções. Escolher quais sons trabalhar em um projeto é tentar planejar e dimensionar as sensações que poderão ser despertadas nos ouvintes. Não sonorizar e silenciar é permitir que o espectador imagine seus próprios sons. Fazer com que alguns sons se destaquem em detrimento de outros é conduzir a percepção para um ponto específico da narrativa. Ou seja, trabalhar com sons é saber que cada escolha feita repercutirá de forma diferente e produzirá uma pluralidade de sentidos e emoções muito grande. E, é exatamente por isso que não se pode definir quais sonoridades devem ser retiradas de nossas paisagens sonoras. Se por um lado é inegável que o silêncio possui uma vasta riqueza semântica nas artes de forma geral, por outro, sua utilização plena tem sido gradativamente mais rara no cinema contemporâneo. A necessidade de um desenvolvimento narrativo de forma dinâmica e acelerada, associada a uma montagem cada vez mais ágil, parece deixar um espaço bem menor para o silêncio. Não há mais tempo para se perder com pausas, com reflexões. Precisamos receber estímulos sonoros sem parar. O que temos atualmente, parece ser a existência de um silêncio dentro do ruído. Imagens que suscitam ambientes e efeitos sonoros barulhentos parecem ser progressivamente substituídos por ambientes e efeitos quase silenciosos, colocando personagens e espectadores num tipo de bolha, como se, apesar de estarem no meio de uma cidade amplamente movimentada, os sons que os rodeiam não fossem percebidos e não os afetassem auditivamente. Se a despoluição sonora pretendida por Schafer foi vista de forma negativa por teóricos e críticos, para os artistas contemporâneos a trabalhar com sonorização audiovisual parece que essa despoluição está cada vez mais em alta. |
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Bibliografia | BARTHES, Roland. “A Escuta”. In O Óbvio e o Obtuso: ensaios críticos III. Léa Novaes (trad.). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. |